Instituição Pesquisadora:
UNIVERSIDADE NOVE DE JULHO (UNINOVE) – PROGRAMA DE MESTRADO EM DIREITO
Coordenação: Irene Patrícia Nohara
Equipe de pesquisa: Vladmir Oliveira da Silveira, Samantha Ribeiro Meyer Pflug, Daniela Almeida Bittencourt, Liziane Parreira, Rodolfo Luiz Maderic, Richardo Anderson Nogueira Oliveira, Erika Megumy Tsukada e Glaucia Cobellis.
Colaborações especiais:
Luiz Carlos Parreira Júnior – TI
Marcos Toyotoshi Maeda – Estatística
SOBRE A PESQUISA
A proposta central da pesquisa foi analisar, por meio da combinação de diversos métodos, a gestão da Força de Trabalho dos entes federativos da Administração Pública, visando construir propostas de aprimoramento normativo dos regimes jurídicos analisados e das políticas de gestão pública orientadas ao objetivo de modernização administrativa a partir da análise do regime jurídico e dos planos de carreiras das Administrações direta, autárquica e fundacional da União, Estados, Distrito Federal e Municípios.
Os desafios enfrentados pela pesquisa não foram poucos. Primeiramente, apesar de a proposta, conforme a configuração do Projeto Pensando o Direito, não ter sido precipuamente a pesquisa da teoria, mas envolver aspectos normativos, empíricos e jurisprudenciais, deve-se advertir que ela não subtraiu a abordagem teórica, sendo este um componente relevante que alicerçou, na medida do possível, a análise dos demais métodos empregados.
Um dos pressupostos teóricos fundamentais da pesquisa é a concepção de que a pretensão de modernização da máquina administrativa, que é composta por agentes públicos, não pode se distanciar da noção de desenvolvimento presente na Constituição de 1988. Por conseguinte, foi dado foco a uma proposta de modernização sustentável com os valores emancipatórios e de proteção social da Constituição da República Federativa do Brasil.
Diante do elevado número de entes federativos no Brasil, sendo ilustrativa deste fato a criação, em 1° de janeiro de 2013, de mais cinco Municípios, perfazendo no Brasil o número de 5.570 municipalidades (IBGE, 2013), houve a delimitação do campo de pesquisa empírica a partir da União, dos Estados-Membros, do Distrito Federal e Municípios localizados em Capitais de Estados. Esta partiu, portanto, do mapeamento normativo comparativo dos estatutos dos servidores públicos de 54 entes federativos, no somatório da União aos 26 Estados-Membros, o Distrito Federal e os 26 Municípios localizados em Capitais de Estados, ressaltando o que cada estatuto contemplaria de diferencial em relação aos congêneres.
Também foi feita pesquisa qualitativa, com base na jurisprudência dos tribunais superiores, para identificar limites e possibilidades de utilização dos regimes de pessoal pelos entes federativos. Neste item, houve ênfase no sentido conferido ao regime jurídico único, haja vista a tentativa de sua extinção pela Emenda Constitucional no 19/98 e sua restauração, em 2007, por deferimento de cautelar com efeitos ex nunc em ação direta de inconstitucionalidade (ADI – MC 2135).
Na sequência, foram realizadas duas pesquisas empíricas: a primeira com base em formulário quantitativo, enviado a todos os entes federativos pesquisados, tendo sido solicitadas diversas informações sobre a quantidade de servidores e a promoção e investimentos existentes nas carreiras; e a segunda utilizou-se de formulário eletrônico denominado “servidores(as) pelos servidores(as)”.
A ideia do formulário eletrônico, em versão digital de rápido preenchimento, direcionado ao servidor público, inspirou-se na vontade de produção de dados bottom-up, isto é, com ponderações de ordem mais democrática. Partiu-se da concepção de que a proposta de alteração, tanto da política de gestão como do regime jurídico dos servidores, deveria considerar as percepções destes para alcançar maior grau de legitimidade.
Em suma, para transcender os cânones da pesquisa tradicionalmente encontrada na área jurídica, sendo esta uma contribuição particularmente incentivada pelo Projeto Pensando o Direito, houve a tentativa de superação da insuficiente análise jurídico-formal dos institutos a partir da utilização simultânea de múltiplos métodos, tais como a análise jurisprudencial qualitativa e, principalmente, a coleta e análise de dados em pesquisa empírica. Esta última foi feita com a intenção de municiar as escolhas dos gestores públicos da Força de Trabalho das diversas Administrações Públicas com análises e dados comparativos e atualizados.
A partir da pesquisa, foram formuladas sugestões de alteração legislativa e de dispositivos constitucionais, via Proposta de Emenda à Constituição, Projeto de Lei Complementar e de alguns aspectos que poderiam ser aprimorados no estatuto dos servidores públicos federais. A principal contribuição inovadora do trabalho foi a sugestão da criação de um mecanismo jurídico, de previsão constitucional, denominado Plano de Gestão da Força de Trabalho, para tornar as práticas administrativas de gestão dos servidores públicos mais racionais, planejadas e, portanto, meritocráticas.
Espera-se ter contribuído com material apto a qualificar o debate sobre as alterações legislativas possíveis futuras Reformas Administrativas do Brasil no século XXI, que repercutam sobre o regime jurídico dos servidores públicos. As propostas sugeridas foram construídas para serem sustentáveis e eficazes na transformação social que o Estado Brasileiro merece vivenciar, em consonância com o projeto de desenvolvimento da vigente Constituição.
Por fim, deve-se registrar o mais profundo agradecimento à qualificada e visionária equipe da Secretaria de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça, encabeçada pelo Ilustre Secretário Marivaldo de Castro Pereira, com especial destaque a Priscila Spécie e Nayara Teixeira Magalhães, pelo apoio em todas as etapas da pesquisa, bem como aos juristas e gestores que participaram do seminário Gestão Pública dos Entes federativos: desafios jurídicos de inovação e desenvolvimento, realizado nos dias 3, 4 e 5 de outubro de 2012 na Universidade Nove de Julho, cujos Anais serão disponibilizados como produto da reflexão estimulada pelo presente material.
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INTRODUÇÃO
O presente relatório contempla a síntese da pesquisa denominada Gestão da Força de Trabalho entre os Entes federativos da Administração Pública, selecionada na Convocação Especial nº 001/2012, objetivando fomentar análises acerca de mecanismos jurídicos para modernização e transparência da gestão pública.
O objetivo geral foi investigar a gestão da Força de Trabalho dos entes federativos das diversas Administrações Públicas brasileiras, visando, a partir da abordagem do regime jurídico presente nos respectivos estatutos, cotejados com diversos planos de carreiras, construir propostas de aprimoramento normativo para a temática. Também se objetivou confrontar algumas insuficiências da abordagem tradicional do Direito Administrativo em relação às necessidades práticas da gestão pública de pessoal, na pretensão de estimular melhorias no desempenho organizacional público.
Trata-se de assunto de extrema relevância, porquanto se entende universal o desejo de reformar o Estado para imprimir-lhe maior eficiência, sendo este um desígnio também associado ao intento de modernização da máquina administrativa. Mas, para alterar o desempenho do Estado, não basta modificar apenas suas estruturas; especial foco deve ser dado ao elemento humano que compõe a Força de Trabalho das Administrações Públicas: os servidores públicos.
A contextualização da temática ocorre porque a última reforma administrativa, realizada na década de noventa, foi incompleta e incapaz de estruturar um molde de desenvolvimento potencial dos servidores públicos que respeitasse a dignidade e a importância dos mesmos. Pelo contrário, houve ênfase punitiva na proposta constitucional de avaliação de desempenho.
A presente proposta toma por pressuposto que o projeto de modernização das estruturas administrativas, que é indissociável da discussão do regime jurídico dos servidores públicos, deve ser alinhado ao projeto de desenvolvimento da Constituição de 1988. Assim, mesmo com a sugestão de inserção de novos dispositivos constitucionais, foi constante o cuidado dos pesquisadores em não modificar avanços propositadamente desejados pelos constituintes, para que a proposta resultasse em sugestões harmônicas com os valores republicanos e democráticos e que estimulassem o trabalho eficiente por critérios de meritocracia, sendo respeitado o princípio do não retrocesso em conquistas sociais já alcançadas.
Não foram poucos os desafios ao longo da realização desta pesquisa. Inicialmente, deve-se mencionar que tratar de gestão da Força de Trabalho das Administrações Públicas envolve tomar consciência de diversas complexidades, sobretudo no tocante aos pressupostos encontrados no Direito Administrativo.
Algumas das principais dificuldades enfrentadas no trato do tema foram a pouca porosidade e o escasso entrosamento entre as abordagens do Direito Administrativo brasileiro e da gestão pública do ponto de vista teórico. Apesar dos muitos avanços na Administração, principalmente quanto ao estímulo comportamental por um trabalho eficiente, o Direito Administrativo ainda é influenciado por uma visão impessoal da burocracia, sendo o servidor público absorto numa atmosfera pretensamente neutra da normatividade estatal, que pairaria, hipoteticamente, acima de uma massa mais ou menos indistinta de agentes públicos.
Colabora com o desenvolvimento de tal atmosfera teórica, que repercute nas práticas, um resquício positivista na abordagem do Direito Administrativo, sendo deixada de lado a multiplicidade de enfoques em nome de um conceito hermético de legalidade administrativa. Soma-se a isso a chamada Teoria do Órgão, que enxerga os atos dos agentes públicos como manifestações por imputação de uma pretensa vontade estatal/ legal, o que dissemina a falsa ideia de que o profissionalismo do servidor público estaria relacionado a uma ação neutra e anônima de um ocupante de cargo público cujas funções seriam todas pré-programadas de forma estanque em estatutos e planos de carreira.
Em suma, o Direito Administrativo contemporâneo não pode reforçar o estereótipo moderno do ser humano como um dente substituível de uma engrenagem na qual não é possível qualquer interferência, uma vez que as atribuições já estariam arquitetadas por um ordenamento distante e inflexível. Trata-se de visão ultrapassada e pouco adequada à agilidade que as organizações públicas demandam nos tempos atuais. Para evitar riscos ou mesmo se adaptar à velocidade exigida pelas transformações sociais e tecnológicas, demanda-se do Estado muito mais do que um funcionamento industrial, como era o exigido das organizações da primeira metade do século passado.
Por conseguinte, houve esforço direcionado à identificação de aspectos limitadores de alguns dos pressupostos fortemente presentes no discurso do Direito Administrativo, sendo necessário ressaltar que os servidores devem ser considerados em sua dignidade humana, o que implica estimular-los a um melhor desempenho, considerando suas habilidades e competências, o gosto pelo trabalho em equipe, a postura criativa e adaptável às novas demandas de uma sociedade em rápida transformação. O rendimento dos servidores deve ser ponderado também em função das limitações materiais e humanas presentes nas organizações públicas.
Entretanto, se, por um lado, o Direito deve compreender as necessidades da gestão de pessoas, por outro, a gestão pública não pode ser mais fomentada à margem do Direito Administrativo, pois os sistemas de controle, inclusive jurisdicional, foram engendrados para corrigir ações administrativas dissonantes do regime jurídico administrativo. Neste ponto, os mecanismos jurídicos de controle acabam influenciando a gestão pública, como foi concluído em pesquisa publicada no volume de número 33 do Projeto Pensando o Direito.
Outro entrave reconhecido na elaboração deste estudo é o fato de que não há uma, mas diversas Administrações Públicas, dada a estrutura federativa brasileira. Portanto, para a equipe cotejar os diversos estatutos, houve a necessidade de delimitação do objeto de pesquisa em 54 entes – quais sejam: a União, os 26 Estados-Membros, o Distrito Federal e os 26 Municípios sedes de Capitais de Estados – por ser inviável aos pesquisadores, em poucos meses, cotejar, por exemplo, os estatutos dos servidores de 5570 Municípios brasileiros.
A análise comparativa foi facilitada pelo fato de haver certa padronização, ditada pela Constituição da República Federativa, no desdobramento das características do regime jurídico aplicável aos servidores públicos. Mas a pesquisa não se restringiu à análise comparativa das determinações normativas da gestão da Força de Trabalho; foram utilizados a análise qualitativa jurisprudencial do regime jurídico único e o método empírico.
A pesquisa qualitativa, com base na jurisprudência dos tribunais superiores, procurou identificar possibilidades e limites jurídicos conferidos pelo Judiciário ao regime de pessoal. Neste item, foi dado destaque ao sentido conferido ao regime jurídico único, tendo em vista a tentativa de sua extinção pela Emenda Constitucional nº19/98 e sua restauração, em 2007, pela ADIn – MC 2135.
As duas pesquisas empíricas tomaram por base um formulário quantitativo, que foi direcionado às Secretarias de gestão de pessoal ou órgãos congêneres dos 54 entes pesquisados e um formulário qualitativo, voltado para o entendimento, entre outros assuntos, do que o servidor pensa das políticas de capacitação da Força de Trabalho.
O formulário quantitativo contemplou os seguintes aspectos: o total de servidores; as três carreiras com maior número de integrantes; quantitativo de servidores em função de faixas de remuneração; duração e características da jornada de trabalho; mecanismos de promoção; controle dos resultados; quantidade de servidores em função da formação; número de servidores com ensino superior que ocupam cargo de ensino médio; presença de programas de capacitação e suas características; quantitativo de servidores revertidos no último ano; número de servidores gozando licença-saúde; e as três carreiras que mais possuem servidores readaptados.
Por sua vez, o formulário eletrônico, intitulado “servidores(as) pelos servidores(as)”, foi estruturado para ser de rápido preenchimento. Partiu-se da concepção de que a proposta de alteração, tanto da política de gestão como do regime jurídico dos servidores, deveria considerar as percepções destes para alcançar maior grau de legitimidade. Houve perquirição, em âmbito digital, acerca do grau de satisfação com as condições de trabalho; os principais problemas identificados na carreira; o motivo escolhido para ser servidor(a); a pretensão de mudar de carreira; a adequação do cargo ocupado com a formação; a percepção sobre os programas de capacitação ofertados; e, também, a avaliação pessoal sobre o discurso de que o servidor público seria menos eficiente do que o trabalhador da iniciativa privada.
A maior dificuldade na realização da pesquisa se deu, conforme será demonstrado, na morosidade e aparente falta de empenho com que a equipe se deparou na coleta de dados nos órgãos de gestão de pessoal dos entes pesquisados. Apenas o Estado de Minas Gerais apresentou o relatório após poucas semanas da solicitação inicial, e quase três quartos dos entes pesquisados, apesar do contato via e-mail, telefonemas diversos e carta registrada, não apresentaram os dados solicitados, mesmo com cinco meses de cobranças contínuas e, em muitos casos, desgastantes. Houve, inclusive, recusa, por parte da Diretoria de Recursos Humanos de Palmas/TO – SEPLAG, de acesso aos dados solicitados.
Este fato prejudica a produção de um material empírico completo, sem lacunas em relação ao universo dos entes pesquisados, mas reforça a proposta defendida da necessidade inarredável de planejamento e de tornar transparentes os dados sobre o contingente e as características da Força de Trabalho das administrações dos entes federativos. A pesquisa teria sido menos dificultosa se os órgãos de gestão tivessem à mão um inventário pormenorizado de sua Força de Trabalho, o qual não parece existir, haja vista que muitos dos formulários enviados retornaram de forma incompleta.
Outra dificuldade encontrada pela equipe foi o fato de que, não obstante a disseminação do formulário eletrônico por redes sociais, mala direta para milhares de servidores, sindicatos, boletins eletrônicos, houve apenas 158 respondentes. Mesmo com a ressalva de não ser a amostragem esperada, tendo em vista a dimensão do universo pesquisado, os resultados da pesquisa digital serão analisados e problematizados, pois eles foram de espontâneo preenchimento.
Para suprir algumas deficiências da pesquisa empírica, uma fonte importante que municiou os pesquisadores de aporte de informação, no tocante às tendências e necessidades na gestão da Força de Trabalho, foi o seminário Gestão Pública dos Entes federativos, que contou, sobretudo no minifórum de escolas de governo, com o relato de gestores públicos engajados na capacitação dos servidores, sendo as reflexões registradas em anais entregues à Secretaria de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça. O Seminário congregou juristas e gestores com ampla experiência e reconhecimento público, os quais contribuíram com reflexões que inspiraram a discussão de 35 pontos-síntese dos rumos da gestão pública eficaz e do Direito Administrativo do futuro.
Acerca das sugestões de alterações normativas, houve a formulação de: (1) uma Proposta de Emenda à Constituição que contempla a criação do Plano de Gestão da Força de Trabalho aplicável às administrações de todos os entes federativos, tornando obrigatório e periódico o planejamento estratégico; (2) um Projeto de Lei Complementar, que regulamenta em caráter nacional o assunto, respeitando a autonomia dos entes federativos; e (3) sugestões para o aperfeiçoamento do Estatuto Federal dos servidores públicos, Lei nº 8.112/90, embasadas nos dados analisados pela pesquisa normativa e em sintonia com a proposta de alteração constitucional.
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DESENVOLVIMENTO
O capítulo concernente ao desenvolvimento da pesquisa será iniciado com a apresentação dos principais resultados para depois partir para a descrição das pesquisas de comparação normativa, dos dados quantitativos da Força de Trabalho dos entes, do formulário eletrônico respondido pelos servidores e da jurisprudência qualitativa dos tribunais superiores, sendo a discussão teórica e crítica feita na sequência.
2.1 Resultados
Como o desenvolvimento da pesquisa abarcou diversos métodos, os resultados variaram em conteúdo.
Do ponto de vista do produto voltado ao aperfeiçoamento da gestão, conforme será exposto no item 3.3, houve a formulação de 35 pontos sobre os rumos da gestão pública eficaz e o Direito Administrativo do futuro, resultantes das reflexões e debates entre os 20 expositores que participaram do seminário Gestão Pública dos Entes federativos: desafios jurídicos de inovação e desenvolvimento.
O seminário desdobrou-se em: (1) três palestras magnas noturnas; (2) quatro painéis multidisciplinares, estruturados nas seguintes temáticas: (a) limites jurídicos de gastos e gestão estratégica; (b) transformações da burocracia, complexidades da gestão e reflexões sobre o papel do Estado; (c) remuneração e desafios de (re)regulação dos servidores públicos; e (d) Federalismo, greve no serviço público e regime jurídico; e (3) o minifórum de escolas de governo, com o relato de expertos em capacitação de servidores públicos.
A pesquisa empírica quantitativa resulta em dados que demonstram o predomínio de servidores estatutários, havendo, no Estado de Minas Gerais, um equilíbrio dos estatutários com temporários e admitidos estáveis. Também foi identificada a predominância de salários de até 4.000 reais, sendo que as maiores remunerações foram variáveis nos Municípios e Estados pesquisados. As jornadas de trabalho também são variáveis, com destaque para Aracajú, que declarou que 95% dos servidores trabalham em jornadas de até seis horas. Quanto à formação, predominam o ensino superior e o médio, destacando os mais de 20% de especialistas em Minas Gerais e no Distrito Federal. Também foi surpreendente observar que 9,3% dos servidores da União possuem Doutorado.
Dos 54 entes que foram convidados a participar da pesquisa, pouco mais de um quarto enviou formulários preenchidos; ainda assim, muitos vieram de forma incompleta. O formulário eletrônico voltado para os servidores contou com apenas 158 respondentes espontâneos, sobressaindo o fato de que metade deles entende que os programas de capacitação oferecidos pela respectiva repartição pública são insuficientes e, ainda, 21,5% classifica tais programas como péssimos.
Tais dados podem ser refletidos à luz de uma observação feita por Fábio Mauro de Medeiros, Diretor da Centresaf, no minifórum da Escola de Governo, segundo a qual existe uma grande demanda de capacitação de servidores, o que ocorre pelas frequentes alterações legislativas acrescidas de novas orientações nas políticas públicas dos diferentes Governos.
Os servidores em geral sentem a necessidade de conhecer a legislação para que tenham certeza e segurança de que realizam suas atividades cotidianas sem o cometimento de irregularidades. Todavia, nem sempre chamar os melhores juristas da área para capacitá- los para novas legislações e procedimentos verte em melhorias efetivas nas práticas administrativas. Como a Escola de Administração Fazendária (Esaf) costuma passar avaliações ao término dos variados cursos de capacitação que promove, constatou-se que diversos servidores sem formação jurídica acabam não tendo compreensão o suficiente para aplicar os conhecimentos transmitidos com profundidade por palestrantes que são referência na área técnica.
Pelo relato de Medeiros, os servidores públicos ficam satisfeitos pelo contato com as palestras, reconhecendo que são de grande qualidade, mas foi identificado que eles nem sempre conseguem aplicar os conhecimentos transmitidos com segurança, provavelmente devido à falta de domínio e formação técnica na área jurídica, que tem as suas peculiaridades.
Para suprir tal lacuna, a Esaf aplica medidas complementares como, por exemplo, criação de material didático ou desenvolvimento de cursos voltados às necessidades práticas do cotidiano dos servidores que capacita.
Também Maria de Fátima Infante, Doutora em Economia pela Unicamp e responsável pela estruturação dos cursos da Escola de Governo de São Paulo da Fundação do Desenvolvimento Administrativo (Fundap) de 2003 a 2007, completou o relato com a seguinte conclusão, transcrita nas mais de duzentas páginas de desgravações dos anais do seminário Gestão Pública dos Entes federativos1:
A área jurídica tem crescido muito, os procedimentos têm ficado muito complexos e a insegurança do gestor público faz com que a área jurídica cresça muito, porque para um dirigente do setor público, que pode incorrer em procedimentos que não lhe agrada, o desconhecimento gera muito desconforto. Isso tem levado a que os advogados, vocês, têm tido uma expressão maior dentro da máquina pública, o que traz para vocês talvez uma responsabilidade maior, pois vocês estão nos assessorando e vão precisar nos assessorar mais, não numa visão jurídica restrita, mas numa visão de gestores públicos, nós precisamos dos parceiros e não dos advogados. É um pouco essa a mensagem que eu gostaria de deixar, porque eu venho vivenciando essa prática dos advogados, mesmo na PGE, que é uma parceira fundamental, inúmeros procuradores da PGE têm hoje uma visão tão avançada que eles contribuem para a inovação no setor público, porque a gente precisa responder às necessidades que estão aí, e às vezes a gente precisa criar coisas novas, o que, dentro da Administração Pública implica em criar procedimentos novos, regramentos novos, enfim, e é disso que a gente precisa: da área jurídica jogando a favor da inovação, para responder melhor às necessidades da população.
Diante do fato de que apenas 14 Secretarias de gestão dos entes federativos responderam aos formulários requisitados e de que, na maior parte destes, os dados solicitados não foram integralmente preenchidos, a conclusão dos pesquisadores foi a necessidade de criação de um mecanismo jurídico que torne efetivamente acessível a dimensão e as características da Força de Trabalho das administrações públicas.
Esta informação deve estar acessível não só à população ou à comunidade Acadêmica, de forma mais específica, mas, principalmente, aos demais órgãos do Estado. Foi, então, pensada a seguinte solução: propor a obrigação jurídica de criação, por todos os órgãos, de um inventário pormenorizado do quantitativo de sua Força de Trabalho, bem como de suas características. Este documento cogente auxiliaria não só no planejamento estratégico da utilização dos servidores, mas também na articulação da Força de Trabalho disponível com as políticas públicas discutidas, no contexto das atribuições funcionais dos servidores.
Em suma, os dados empíricos revelaram que falta, além da adequada capacitação da Força de Trabalho, principalmente o planejamento estratégico. Se as Secretarias de gestão de pessoal levam meses para levantar dados sobre quem são os seus servidores e suas respectivas capacitações, tal fato é um elemento indicativo de que a maioria delas não dispõe de bancos de dados completos e sistematizados ou, ainda, se dispõe, não aprecia compartilhá-los com a comunidade Acadêmica, o que é igualmente preocupante.
Ora, posto que as políticas públicas e prioridades da Administração Pública são alcançadas não apenas com os bons projetos ou com recursos disponíveis, mas também com a articulação de tais projetos e recursos com ações estratégicas daqueles que irão executá-las, que são os servidores públicos, a conclusão da equipe foi sugerir a criação do denominado Plano de Gestão da Força de Trabalho.
Trata-se de mecanismo jurídico fundamental para a coordenação da Força de Trabalho, contribuindo para gerar maior eficiência na atuação estatal. O Plano de Gestão da Força de Trabalho foi inspirado nas leis orçamentárias, para que seja democrático, periódico, dialogado e garanta a participação de associações representativas – como sindicatos de servidores.
Já que, de acordo com o art. 174 da Constituição, o planejamento é imperativo para o setor público, concluem Floriano de Azevedo Marques Neto e João Eduardo Lopes Queiroz: “a partir da vigência da Constituição de 1988, o Estado obrigatoriamente deve ter uma política planejadora para todos os seus setores, para a Administração direta e para a Administração indireta” (NETO; QUEIROZ, 2011, p. 693).
Conforme a obra Direito Administrativo Econômico, planejamento é um processo dinâmico e que, portanto, deve envolver a continuidade, tendo em vista que, na execução do planejado, há alterações no cenário inicial, o que exige dos gestores públicos a necessidade de revisão e ajuste de metas e medidas à nova conjuntura, para o adequado enfrentamento das circunstâncias e melhor atendimento dos interesses públicos (NOHARA, 2011, p. 1235).
Considerou-se, portanto, fundamental a articulação da realidade de planos nacionais e regionais de desenvolvimento, assim como o planejamento dos gastos e sua associação a deliberações prioritárias que ocorrem no âmbito da discussão orçamentária. Ainda, um planejamento periódico também da gestão da Força de Trabalho do Poder Público, a partir da exigência da criação e disseminação de um inventário pormenorizado – obrigatório para as Administrações de todos os entes federativos – da situação funcional dos servidores públicos, a partir do qual haveria condições de se controlar e deliberar sobre o uso racional dos recursos humanos presentes nos órgãos públicos.
A equipe entendeu que esta solução seria uma forma adequada de: (a) minimizar o impacto do legado patrimonialista no uso dos cargos e funções públicas, na chamada desorganização dos serviços (LEAL, 1975, p. 24), em que predomina a ausência de obrigatoriedade no planejamento; e, ainda, (b) tornar mais democráticas e dialogadas as formas de estabelecimentos gerais, por meio de cotas, das políticas de gestão de pessoal, cujo uso resguardaria, também, uma margem de discricionariedade aos órgãos próprios de gestão de pessoas.
Não se trata de o Legislativo se imiscuir nos assuntos do Executivo, mas da criação de um mecanismo no qual o Executivo compartilhe com outras instâncias, de forma estratégica, a maneira como promove ou pretende promover a gestão de sua Força de Trabalho, sendo este, em realidade, o cerne da articulação dos freios e contrapesos (checks and balances), uma vez que não é defensável no Estado Contemporâneo uma separação estanque entre os Poderes, reforçando-se os sistemas de controle. Onde há planejamento, é possível haver controle social, mesmo que de orientação, sendo este preferível ao controle focado na punição.
Nesta perspectiva, é conhecido o raciocínio de Montesquieu2 (1748) no sentido de que “c’est une expérience éternelle que tout homme qui a du pouvoir, a tendance à en abuser. Tout homme va jusqu’à ce qu’il trouve des limites”, isto é, é uma experiência perene que toda pessoa que tem poder tende a abusar dele, pois a ação humana vai de encontro a limites.
O questionamento que surge frente ao exposto é: deixar os órgãos de gestão de pessoal com uma “carta branca” para conduzirem suas atividades de forma meramente legalista ou política, na pior acepção de tais palavras, ou criar um mecanismo jurídico que abra a “caixa preta” da gestão de pessoas no setor público, organize os dados de forma criteriosa e ainda demonstre periodicamente que o uso dos recursos humanos é estrategicamente articulado com as políticas públicas e com a discussão dos recursos orçamentários disponíveis para tanto?
Escolhemos esta segunda opção como mais acertada em comparação com os limitados planos de “exoneração” voluntária; redução do funcionalismo ou corte de direitos; flexibilização da estabilidade – que foram estratégias valorizadas pela última Reforma Administrativa, a qual, conforme será exposto, se voltou mais ao ajuste fiscal propriamente dito do que à capacitação e valorização da Força de Trabalho existente na Administração Pública, o que demandaria investimentos.
É melhor aproveitar racionalmente do que se dispõe, de forma tática e respeitadora da dignidade e do regime jurídico dos servidores públicos. Pensando nisso, houve a estruturação de uma Proposta de Emenda à Constituição (presente na íntegra nos anexos), almejando a previsão de um Plano Anual e Plurianual de Gestão da Força do Trabalho.
Como a última Reforma Administrativa, na forma da Lei Complementar, deu uma tônica exclusivamente punitiva à avaliação periódica de desempenho – pois a previu como um procedimento –, após ampla defesa – apto a provocar a perda do cargo do servidor estável, conforme inciso III, inserido no § 1º do art. 41 –, acabou por esvaziar o sentido construtivo do instituto, o que provocou um refreamento no ímpeto de criação da lei complementar que o disciplinaria.
Em suma, ao invés de ser um instrumento voltado ao desenvolvimento potencial dos servidores públicos, dentro de uma cultura de avaliação de rendimento e de discussão de metas, a tônica constitucional foi exclusivamente dada ao caráter punitivo, que deveria ser previsto como excepcional, pois uma cultura organizacional que prima pela evolução constante deve construir um procedimento de avaliação de desempenho equilibrado e capaz de inserir o trabalhador dentro dos objetivos institucionais, promovendo orientação e contextualização, bem como a existência de um sistema de ascensão e progressão funcionais pautado em critérios objetivos, provocando maior racionalização e, portanto, meritocracia.
Conforme será visto na análise do formulário digital, quanto à questão acerca do grau de influência política na ascensão na carreira, a resposta mais encontrada foi: “ascendem mais os que têm influência política” – percepção negativa, pois este tipo de visão desestimula o desempenho comprometido com as atribuições funcionais.
A proposta da equipe pondera ainda, conforme dito, que deve haver um equilíbrio entre os rendimentos quantitativos e qualitativos no desempenho das atribuições e no cumprimento das metas estabelecidas em políticas públicas, para que o serviço público e as demais atividades estatais não sejam vistos da perspectiva neotaylorista ou industrializante, que são, conforme será exposto, inadequadas ao atual estágio de desenvolvimento da sociedade contemporânea.
Também se enfatizou que a eficiência e a eficácia no cumprimento de atribuições funcionais devem ser mensuradas no contexto das “condições estruturais e humanas existentes nas respectivas repartições”. Há a necessidade de afastar do universo público a prática de fixação de metas excessivas e de ameaças infundadas de ausência de ascensão na carreira por motivos alheios à dedicação do servidor público, pois de nada adianta exigir metas que não sejam compatíveis com as possibilidades fáticas existentes.
Da análise comparativa dos estatutos dos entes federativos investigados, houve, como resultado, o descritivo dos diferenciais identificados. Neste ponto, há a sugestão de alterações de alguns dispositivos do Estatuto Federal, Lei nº 8.112/90.
Por fim, a pesquisa jurisprudencial revelou algo já intuído: existe um descompasso de interpretação nos tribunais superiores quanto ao alcance da expressão do regime jurídico único. Também ficou evidenciado que tal descompasso gera insegurança quanto a vários assuntos jurídicos decorrentes, como, por exemplo, o regime de aposentadoria e qual a justiça competente para julgar os celetistas admitidos na Administração direta, autárquica e fundacional a partir da extinção do regime único pela Emenda Constitucional nº 19/98, sobretudo com a restauração ex nunc por via da ADIn 2135-4, de 2007.
2.2 Análise comparativa dos estatutos
A pesquisa partiu da análise e comparação dos estatutos dos servidores de cada ente federativo abordado. Foi feito o exame dos dispositivos constitucionais que tratam dos servidores públicos, sendo cotejadas tanto as Constituições Estaduais quanto as Leis Orgânicas dos Municípios sede de Capitais de Estados.
Para realizar esta laboriosa tarefa, o grupo se dividiu por regiões. Cinco pesquisadores ficaram responsáveis pelos Estados e Municípios de Região própria, mas a equipe se reuniu periodicamente para discutir resultados parciais obtidos e para realizar a comparação.
Como os estatutos, em sua maioria, contemplam dispositivos bastante similares, os pesquisadores optaram em ressaltar neste item as diferenças, com foco naquelas que servem de exemplos positivos, as quais foram encontradas em maior profusão nos estatutos posteriores à Constituição de 1988.
Também foi aproveitado o contexto para inserir mapas com dados sobre a divisão do vínculo funcional dos servidores nas Administrações Públicas das Capitais de Estados- Membros, circunstância em que foram mesclados os dados produzidos pela pesquisa empírica nos formulários quantitativos preenchidos pelos entes (UNINOVE e SAL/MJ, 2012) com dados de 2011 fornecidos à equipe pelo IBGE.
Como não houve o fornecimento de dados dos respectivos Estados-Membros pelo IBGE, a pesquisa restringiu-se, neste ponto, aos Municípios representados por suas Capitais. As lacunas das informações dos Estados podem ser completadas com as tabelas expostas no próximo item, ao menos quanto aos quatro Estados que participaram enviando os dados solicitados, que são: Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás e Minas Gerais.
Conforme se observa nos mapas que tratam dos vínculos funcionais das Administrações Diretas dos Municípios, elaborados por Região, dá-se que: nas Municipalidades sedes de Capitais de Estados, em geral, mais de 70% dos servidores são estatutários, com destaque para os Municípios de São Paulo e do Rio de Janeiro, cujo número ultrapassa 90%. Também se enfatizou, em amarelo, que há exceções, como, por exemplo, Boa Vista, João Pessoa e Goiânia, que possuem menos da metade dos servidores estatutários.
De todas as Capitais de Estados, Palmas é a que possui o maior número percentual de contratações de celetistas na Administração Direta, correspondente a 25,8%, sendo seguida por Goiânia (24,1%). Este último Município apresentou os dados mais discrepantes de vinculação funcional, porquanto declarou possuir 12 vezes mais admitidos estáveis (67,4%) – isto é, estabilizados pelo art. 19 do ADCT (cinco anos continuados de exercício em 1988) que não ingressaram por concurso público – do que o número de servidores estáveis, correspondente a 5,4%.
João Pessoa, segundo dados do IBGE, possui maior número percentual de contratações temporárias (49,5%) do que de vínculos estatutários (45,8%). Também os números quantitativos que Boa Vista apresentou no formulário demonstram que as contratações temporárias (40,1%) aproximam-se do número de estatutários (43%).
Quanto aos planos de carreira específicos, observou-se que há, nos 54 entes pesquisados, milhares de carreiras que são desdobradas a partir dos estatutos genéricos, sendo inviável, portanto, para efeitos desta pesquisa, mapear da mesma forma comparativa (como foi feito com os estatutos) tais diplomas.
Ademais, do cotejo do emaranhado dos planos de carreira com os estatutos, a percepção geral do grupo foi de que os planos de carreira não seguem padronização, nem há como promover, de forma sistemática, uma consolidação deles, em função da diversidade/ variabilidade existente.
Cogitou-se, como hipótese, que tal heterogeneidade adviria, provavelmente, do fato de que os planos de carreira são mais concretos; logo, sofrem mais de perto os reflexos das disposições orçamentárias e de seus limites. Por isso, a equipe acredita que a ideia que será proposta, de criação de um Plano de Gestão da Força de Trabalho, pode ter reflexos sistematizadores dos planos de carreiras com os demais diplomas normativos, evitando-se o divórcio identificado.
União
A legislação da União é geralmente tomada como um paradigma da regulação dos estatutos, até porque é a mais conhecida, devido à tradição que se tem de transmitir a legislação Federal como um dado principal desde os bancos universitários de Direito. No entanto, a presente pesquisa objetiva verificar as disparidades existentes em relação às legislações editadas pelos entes federativos.
Quanto à organização da Força de Trabalho, a União toma por base o Estatuto dos servidores públicos Federais, Lei nº 8.112/90, sendo que a Lei nº 8.745/93 disciplina a contratação por tempo determinado para atender o excepcional interesse público, nos termos do art. 37, IX, da Constituição Federal.
O Estatuto Federal dos servidores (Lei nº 8.112/90) não delimita de forma precisa as funções a serem desenvolvidas, que ficam dependentes da legislação de cada carreira em especial, mas estabelece todo o regramento concernente à investidura, às formas de provimento (nomeação, promoção, readaptação, reversão, aproveitamento, reintegração e recondução), aos direitos e deveres, às regras para a remuneração, às vantagens devidas, às hipóteses de afastamento, entre outros. Ainda, ele prevê assentamento individual dos servidores no qual serão registrados o início, a suspensão, a interrupção e o reinício do exercício, como forma de controle prevista no art. 16.
No âmbito Federal, a jornada de trabalho está prevista genericamente no art. 19 da Lei, sendo fixada em razão das atribuições pertinentes aos respectivos cargos, respeitada a duração máxima do trabalho semanal de 40 horas e observados os limites mínimo e máximo de seis horas e oito horas diárias. No estágio probatório, serão aferidas a aptidão e a capacidade de desempenho do cargo, observados os seguintes fatores presentes no art. 20 da Lei: assiduidade, disciplina, capacidade de iniciativa, produtividade e responsabilidade.
Não há regramento específico quanto à capacitação permanente, tão somente a alusão à avaliação para que o servidor ultrapasse o estágio probatório. Como não houve a criação desta pela Emenda Constitucional nº 19/98, Lei Complementar, conforme acréscimo feito ao art. 41, § 1º, da Constituição, ela terá efeitos na progressão ou ascensão do servidor, não sendo apta, por exemplo, a provocar a sua demissão pautada em insuficiência de rendimento.
Sugestões de alterações no Estatuto Federal (Lei nº 8.112/90)
São feitas as seguintes sugestões de alterações pontuais da Lei nº 8.112/90: (1) no art. 5º, § 2º, substituir a reserva para deficientes de “até 20%” das vagas de concurso, para a previsão de percentual mínimo, pois reservar até um limite não é promover efetiva inclusão, mas pode provocar o efeito contrário, isto é, excluir situações em que seria possível contratar um maior número de deficientes, sendo necessário fixar um percentual mínimo e não simplesmente um teto; (2) aumentar o estágio probatório para 36 meses, seguindo a sistemática constitucional, pois se entende o estágio probatório como o período de verificação das aptidões do servidor para o exercício de suas funções, que antecede à aquisição da estabilidade, sendo esta a tendência dos tribunais e de medida provisória que foi alterada em sua conversão; e (3) excluir a hipótese do art. 29, I, isto é, de recondução do estável a cargo anteriormente ocupado em razão de inabilitação em estágio probatório relativo a outro cargo, pois se afigura, a nosso ver, um privilégio infundado, dado o fato de uma pessoa que se desvincule de dada carreira para seguir outra e mostre-se inábil no estágio probatório retorne à anterior carreira, inclusive porque a exoneração de estágio probatório deve ser revestida de ampla defesa, sob pena de invalidação judicial.
Distrito Federal
No Distrito Federal, o mapeamento foi feito com base na Lei Orgânica Municipal, de 8 de junho de 1993, e na Lei Complementar nº 840, de 23 de dezembro de 2011, que representa o Estatuto dos Servidores Distritais. As seguintes observações poderão ser feitas: os critérios de remuneração são apontados; os direitos e benefícios são descritos apenas no Estatuto; as características da duração da jornada de trabalho, mecanismos de promoção, atividades de capacitação, afastamentos, formas de readaptação, reversão, reintegração, recondução, provimento, exoneração, remoção e exoneração são abordadas também no Estatuto.
Análise geral da Região Centro-Oeste
Por meio do mapeamento realizado com as legislações do Estado do Mato Grosso do Sul, pôde ser percebido que ele é o único da Região Centro-Oeste que possui expressamente no seu texto constitucional regras de combate ao nepotismo na Administração Pública.
Assim, antes mesmo da edição da súmula Vinculante nº 12, de 21.08.2008 – inspirada na Resolução do Conselho Nacional de Justiça nº 7, de 18 de outubro de 2005, reputada constitucional pelo STF na ADC-MC nº 12 – a Emenda Constitucional Estadual nº 19, de
6/6/2002, previu, no § 7º, do art. 27 da Constituição do Estado do Mato Grosso do Sul a vedação ao nepotismo, sendo que o § 8º proíbe a qualquer servidor o exercício de cargo, emprego ou função sob as ordens imediatas de superior hierárquico de que seja cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo ou afim, até o terceiro grau civil.
Todos os diplomas mencionados, isto é, tanto a Constituição Estadual como o Estatuto do Estado, possuem estipulação de critérios de remuneração; já o Estatuto dos Servidores e a Lei Orgânica Municipal apresentam um rol de direitos e benefícios que inclui licenças e indenizações. As jornadas de trabalho têm previsão nas Constituições e nos estatutos.
Não há na Constituição ou no Estatuto normas que regulamentem instrumentos de controle de resultados, incentivo de trabalho qualificado e de produtividade. O afastamento somente é tratado no Estatuto do Servidor. Formas de readaptação, remoção, nomeação, recondução, reversão e reintegração só são tratadas nos estatutos.
A partir do mapeamento realizado com as legislações do Estado do Mato Grosso, a seguinte observação pode ser feita: tanto na Constituição como no Estatuto do Servidor, na Lei Orgânica Municipal e no Estatuto do Servidor Municipal há estipulação de critérios para remuneração. São apresentados no Estatuto o rol de direitos e benefícios, incluindo as licenças e indenizações ao servidor. No tocante à duração da jornada de trabalho, a Constituição e Estatuto do Servidor não fazem qualquer menção a essa questão.
Quanto aos mecanismos de promoção, somente o Estatuto do Servidor e Estatuto do Servidor Municipal os regulamentam. Na Constituição e no Estatuto do Servidor, há previsão de instrumentos para incentivo às atividades de capacitação. O afastamento somente é tratado no Estatuto do Servidor. Formas de readaptação, remoção, nomeação, recondução, reversão e reintegração são tratadas apenas nos estatutos.
O mapeamento realizado com as legislações do Estado do Goiás revela que a Constituição Estadual, o Estatuto dos Servidores Estaduais e Municipais e a Lei Orgânica do Município estipulam critério de remuneração. Somente o Estatuto dos Servidores apresenta rol de direitos e benefícios, incluindo as licenças e indenizações ao servidor. A Constituição e Estatuto do Servidor não fazem qualquer menção à duração da jornada de trabalho.
Análise geral da Região Norte
Sobre análise geral dos regramentos concernentes aos servidores públicos da Região Norte, constata-se que tanto as Constituições quanto as Leis Orgânicas dos Municípios e estatutos dos servidores públicos estipulam critérios de remuneração, mesmo que de forma genérica. Os estatutos são relativamente padronizados na previsão de direitos e benefícios que incluem licenças e indenizações.
Afastamento, readaptação, remoção, nomeação, recondução, reversão e reintegração não estão previstos de forma expressa nas Leis Orgânicas e Constituições Estaduais. Assim, são disciplinados apenas nos estatutos.
Houve dificuldade na pesquisa da lei específica de contratação temporária, tendo sido encontradas apenas as legislações dos Estados do Pará e de Tocantins. O Estatuto dos Servidores Públicos de Rio Branco, no Acre, entretanto, contempla capítulo específico de contratação de temporários.
Vale ressaltar também que o Estatuto do Estado de Rondônia (Lei Complementar nº 68, de 9 de dezembro de 1992) é o único que prevê de forma expressa o treinamento do servidor público, nos seguintes termos do art. 63: “Aos poderes constituídos, ao Ministério Público e ao Tribunal de Contas, dentro da política de valorização profissional, compete planejar, organizar, promover e executar cursos, estágios e treinamento para capacitação dos Recursos Humanos”.
Há também planejamento do treinamento por determinação expressa do parágrafo único do art. 63 do Estatuto: “a Fundação Escola de Serviço Público de Rondônia elaborará até o dia 31 de julho de cada ano o plano anual de treinamento do exercício seguinte”.
Análise geral da Região Nordeste
O Estatuto dos servidores de Alagoas contempla regras sobre: organização da Força de Trabalho; delimitação do exercício das funções; critérios e valores de remuneração; direitos e benefícios devidos; direitos e deveres das partes; características e duração da jornada de trabalho; mecanismos de promoção; afastamentos; formas de readaptação, reversão, reintegração; formas de provimento, remoção e exoneração. Já Maceió não possui previsão de mecanismos de promoção e recondução do trabalhador. Em ambos os estatutos, nota-se ausência de menção às atividades de capacitação e qualificação, bem como à recondução do trabalhador.
As características e duração da jornada de trabalho não se encontram no Estatuto do servidor da Bahia, ao contrário de Salvador. Da mesma forma, não se versa sobre mecanismos de promoção no Estatuto de Salvador, diferentemente do Estatuto da Bahia. Em ambos, há ausência das atividades de capacitação e qualificação.
O art. 39 da Constituição Estadual da Bahia garante ao servidor que exercer por dez anos, contínuos ou não, cargos em comissão e funções de confiança o direito de continuar a perceber, no caso de exoneração ou dispensa, como vantagem pessoal, o valor do vencimento correspondente ao cargo de maior hierarquia que tenha exercido por mais de dois anos contínuos, obedecido para o cálculo o disposto em lei, conforme redação da Emenda Estadual nº 7/99.
Chama a atenção, como um diferencial, na Lei Orgânica do Município de Fortaleza, o amplo rol de direitos e garantias dos servidores públicos positivados em vinte incisos do art. 116, que são complementados por 18 incisos do art. 117. Existe previsão de cursos de pós-graduação e de capacitação técnica e profissional do servidor, mas o art. 122 determina que tais cursos serão custeados pelo Município somente quando houver correlação entre o conteúdo programático e as atribuições do cargo exercido ou outro da mesma carreira e em instituições devidamente reconhecidas pelo Poder Público, além da conveniência para o serviço desempenhado. O art. 123 determina que, enquanto frequentar curso de nível superior, o servidor poderá requerer redução da jornada diária de trabalho em até duas horas, ficando a critério da administração a concessão do benefício.
Os estatutos do Estado do Ceará e do Município de Fortaleza não contemplam características e duração da jornada de trabalho e nem os instrumentos de controle de resultados, incentivo ao trabalho qualificado e à produtividade e das atividades de capacitação e qualificação. A recondução do servidor não se encontra no estatuto do Ceará.
Os assuntos referentes aos mecanismos de promoção e instrumentos de controle de resultados, incentivo ao trabalho qualificado e à produtividade não são encontrados nos estatutos do Estado do Maranhão e do Município de São Luís. Ainda, neste não há norma quanto às atividades de capacitação e qualificação.
No estatuto de João Pessoa não há alusão aos critérios e valores de remuneração, características e duração da jornada de trabalho, instrumentos de controle de resultados, incentivo ao trabalho qualificado e à produtividade, atividades de capacitação e qualificação e a recondução do trabalhador. O Estado da Paraíba não alude ao dispositivo mecanismo de promoção, apenas. Não há, nos estatutos da Paraíba e de João Pessoa, mecanismos de promoção. Também estão ausentes no Estatuto de João Pessoa critérios e valores de remuneração, características e duração da jornada de trabalho, instrumentos de controle de resultados, incentivo ao trabalho qualificado e à produtividade, atividades de capacitação e qualificação e recondução do trabalhador.
A recondução do trabalhador é encontrada nos estatutos dos Estados da Bahia, Maranhão, Paraíba, Piauí e Rio Grande do Norte, e nas Capitais de Salvador, Fortaleza, São Luís, Teresina e Natal. Nos demais Estados e Capitais, este dispositivo não se faz presente. Nota-se que há uma tendência à equiparação dele entre os Estados e as Capitais.
A remoção é contemplada nos estatutos das Capitais de Fortaleza, São Luís, João Pessoa, Natal e Aracaju, e nos Estados de Sergipe e Rio Grande do Norte. No tocante aos assuntos “controle de resultados”, “incentivo ao trabalho qualificado” e à produtividade, apenas as capitais Maceió, Salvador e Teresina e os Estados da Bahia, Paraíba e Piauí fazem referência à produtividade.
Análise geral da Região Sudeste
A Região Sudeste apresenta 75% dos diplomas estatutários como sendo anteriores à Constituição de 1988, o que, por vezes, gera problemas na discussão sobre a recepção de diversos dispositivos legais. Assim, dos oito estatutos – contando com quatro Estados- Membros e quatro Municípios –,apenas dois são posteriores à Constituição de 19988: o Estatuto de Belo Horizonte (Lei Municipal nº 7.169, de 30 de agosto de 1996) e o do Espírito Santo (Lei Complementar nº 46, de 31 de janeiro de 1994).
No caso do Estatuto dos Funcionários Públicos do Estado de São Paulo, Lei nº 10.261, de 28 de outubro de 1968, houve a atualização pela Lei Complementar nº 942, de 6 de junho de 2003, ocasião em que se revogou diversos dos artigos que claramente não haviam sido recepcionados pela Constituição.
Contudo, mesmo com a atualização feita por legislação superveniente, ainda pairaram dúvidas sobre se alguns dispositivos de constitucionalidade duvidosa possuem eficácia. É o caso da aplicação de demissão por “ineficiência no serviço”, disposta no art. 256 da Lei nº 10.261/68.
Houve dificuldade em encontrar as leis de contratações temporárias e, por isso, deu- se a solicitação delas às Casas Legislativas dos respectivos entes. No caso do Estado de São Paulo, a contratação temporária de servidores públicos é feita de acordo com a Lei Estadual nº 500/74, diploma anterior à Constituição de 1988.
Em comparação com a Lei Federal de contratação por tempo determinado – Lei nº 8.745/1993, que se volta precipuamente às necessidades temporárias de excepcional interesse público listadas no art. 2º, como, por exemplo, calamidade pública, assistência a emergências em saúde pública, recenseamentos e pesquisas do IBGE, admissão de professor substituto e professor visitante –, no Estado de São Paulo existe a prática de gestão da Força de Trabalho por meio de contratação de “concursados que estão aguardando vaga para serem nomeados em cargo público (…) quando ocorre a cessação da necessidade do serviço, pelo provimento do cargo, o servidor é dispensado” (CANALE, 2007). Isso ocorre principalmente pela demora em nomear e empossar os aprovados, em áreas que possuem demandas crescentes de profissionais, como as da saúde e educação.
Observa-se que o Estatuto do Espírito Santo possui disposições normativas que tratam de contratações temporárias de excepcional interesse público (arts. 288 a 292). Já a Lei Orgânica de Belo Horizonte veda expressamente, no art. 46, § 2º, o desvio de função de contratado por tempo determinado, disposição que também é encontrada no art. 190 da Lei Orgânica do Município do Rio de Janeiro.
Ademais, verificou-se que a prática da gestão pública por vezes se divorcia da sistemática do Direito Administrativo. Há leis que tratam de carreiras públicas que, não obstante serem baseadas nos estatutos genéricos dos servidores, acabam atualizando disposições acerca das remunerações, funções, cargos, salários, avaliações de desempenho, progressões, sem seguirem necessariamente o espírito sistemático que o assunto da gestão da Força de Trabalho requer, fenômeno que foi acentuado ainda mais pela necessidade de observação dos limites de gastos fiscais. Valores em percentuais não são, geralmente, disciplinados nos estatutos genéricos dos servidores.
O Estatuto de Belo Horizonte é o mais recente e pode ser considerado um dos mais modernos e pormenorizados. De acordo com seu art. 5º (Lei Municipal nº 7.169, de 30 de agosto de 1996), há a previsão da instituição do Conselho de Administração de Pessoal há a previsão da instituição do Conselho de Administração de Pessoal (Conap), Conap, como unidade da Secretaria da Administração, voltado a questões direcionadas às diretrizes administrativas de pessoal e recursos humanos da Municipalidade. No art. 6º do Estatuto, há o incentivo à liberdade de negociação nas relações entre as entidades representativas dos servidores Municipais e à Administração Municipal, especialmente no tocante à remuneração, condições de trabalho e soluções de conflitos, o que é inovador e consentâneo com os valores pluralistas e democráticos da Constituição.
No Estatuto de Belo Horizonte, são previstos os seguintes critérios para avaliação do servidor ao longo de sua vida funcional: (1) desempenho satisfatório das atribuições do cargo; (2) participação em atividades de aperfeiçoamento, relacionadas com as atribuições específicas do cargo; (3) disponibilidade para discutir questões relacionadas com as condições de trabalho e finalidades da Administração Pública; (4) elaboração de trabalhos ou pesquisa visando ao melhor desempenho do serviço público; (5) iniciativa na busca de opções para melhor desempenho do serviço; e (6) observância de todos os deveres inerentes ao exercício do cargo.
É interessante observar que os prazos para aquisição de estabilidade ou mesmo para progressão na carreira são contados, neste Estatuto, diferentemente de outros, em dias.
Análise geral da Região Sul
No tocante à facilidade e acesso às informações dos diplomas legislativos dos servidores, impende ressaltar que o site do Governo do Estado do Paraná se destaca pela acessibilidade, sendo disponibilizado um FAQ para sanar dúvidas dos servidores sobre seus direitos e garantias.
Tanto a Constituição Estadual do Paraná quanto o Estatuto dos Servidores Públicos Civis são extensos e organizados. Estabelecem a organização da Força de Trabalho e delimitação do exercício das funções, especificam os critérios de remuneração, sem definir valores, e os direitos e benefícios são os tradicionalmente previstos nos estatutos em geral.
A jornada de trabalho é abordada na Constituição em três incisos, sendo pormenorizada no Estatuto. Somente no Estatuto do Paraná foram encontrados instrumentos de controle de resultados, incentivo ao trabalho qualificado e à produtividade, sendo alguns incentivos estendidos também para os familiares de servidores. O Estatuto de Curitiba contempla regras de organização da Força de Trabalho, mas não há pormenorizações quanto ao incentivo ao trabalho qualificado e à produtividade, bem como a atividades de capacitação e qualificação.
O Estatuto dos servidores públicos de Santa Catarina, Lei nº 6.745, de 28 de dezembro de 1985, dispõe sobre a organização da Força de Trabalho e delimita o exercício das funções. Os critérios de remuneração são explicados, sem qualquer menção a valores e percentuais. Quanto aos instrumentos de controle de resultados, incentivo ao trabalho qualificado e à produtividade, não houve tratamento mais específico, sendo que o quesito “qualificação” se resume ao treinamento.
Da Região Sul, pode-se dizer que a Constituição do Rio Grande do Sul é que a mais prevê direitos aos servidores, trata da organização da Força de Trabalho, delimitando o exercício das funções e os critérios de remuneração, direitos e benefícios, características da jornada de trabalho e mecanismos de promoção. Há a previsão de incentivo à realização de cursos no País e no exterior.
É também prevista gratificação de jeton nos direitos e benefícios do Estatuto de Porto Alegre. O mecanismo de promoção deriva de aprovação em concurso interno. Os instrumentos de controle de resultados não constam na legislação. Há capacitação com previsão de afastamento para estudos.
Nos Estados-Membros que estão sendo cotejados conjuntamente à União, também predomina a condição de “estatutários”, com destaque para Minas Gerais, onde há um equilíbrio entre “estatutários”, “temporários” e “admitidos estáveis”.
2.4 Percepções dos servidores no formulário digital
É importante aqui que se explique a forma como a Secretaria de Assuntos Legislativos (SAL) ideia do formulário eletrônico foi dar aos servidores públicos a oportunidade de dizer o que pensam das condições de trabalho, se estão satisfeitos, qual o motivo que os fizeram escolher ser servidores, se pretendem mudar de carreira, se entendem que faltam recursos humanos onde desenvolvem suas funções, se ocupam cargo compatível com a sua formação, a percepção geral sobre os programas de capacitação da repartição, entre outros assuntos.
Apesar da disseminação da pesquisa por redes sociais, boletins eletrônicos, mailing de órgãos públicos e sindicatos de todos os servidores dos entes pesquisados, a equipe conseguiu apenas 158 preenchimentos, número não tão expressivo se considerado o universo pesquisado, mas que não é desprezível, visto que o preenchimento foi absolutamente espontâneo.
Serão expostos, para efeitos da presente publicação, os resultados gerais de forma objetiva, sendo os gráficos pormenorizados na versão expandida dos relatórios.
Houve, conforme analisado, um equilíbrio entre participantes da esfera Federal (37%) e Estadual (41%), sendo 22% dos servidores de âmbito Municipal. Apenas um servidor do Distrito Federal participou. Dos que responderam o formulário eletrônico, 78% eram servidores estatutários e 68% possuíam ensino superior.
Predominou a resposta de insatisfação com as condições de trabalho: foram 78% os que disseram não estarem satisfeitos, contra 22% satisfeitos. Ainda, 38% dos insatisfeitos apontaram a remuneração como sendo o principal motivo da insatisfação, sendo que 15% consideram a rotina desestimulante. Nota-se que 41% dos participantes declararam estar estudando para prestar outro concurso público, mesmo diante do fato de quase três quartos dos participantes afirmarem que ocupam cargos compatíveis com a formação.
O principal motivo para a escolha por ser servidor público foi gozar de benefícios como a estabilidade. Na sequência, 20% preferem o serviço público a trabalhar na iniciativa privada e 15% alegam ter vocação.
Ainda, 74% dos servidores consideram os cursos de capacitação oferecidos pela repartição onde estão lotados como péssimos ou insuficientes, e apenas 6% dos participantes disseram que os cursos são ótimos ou excelentes. Ainda, 73% dão razão à afirmativa de que “Quem trabalha mais no serviço público, não tem o devido reconhecimento”.
Dos participantes, 66% acreditam que “faltam recursos humanos para atender a quantidade de trabalho cotidiana”; 65% consideram que também “faltam recursos materiais (como boas condições de tecnologia de informação) para bem realizar o trabalho”.
Um percentual maior de servidores acha injusto o discurso de que “o servidor público é menos eficiente do que os trabalhadores da iniciativa privada”, considerando que 31,64% dos respondentes reputaram tal afirmativa igualmente válida/inválida, sendo que, enquanto aproximadamente 40% acham mais injusta, apenas 28,47% consideram-na mais justa.
Uma parte igual a 66% dos participantes considera que “a Administração ainda não fornece a capacitação devida a seus servidores”.
Curioso notar que na resposta à pergunta “você tem mais respeito do que os seus colegas com os princípios da Administração Pública em seus atos funcionais?”, apenas 2,6% responderam que não (quatro pessoas), 29,7% (47 pessoas) disseram que “tanto quanto eles” e 67,7% dos servidores (correspondente a 107 dos 158 participantes) alegaram que têm mais respeito do que os colegas.
Ora, se quase 70% dos participantes consideram que têm mais respeito pelos princípios do que os colegas, o intérprete é levado, logicamente, à conclusão de que as pessoas se veem mais virtuosas, pois onde estariam, estatisticamente, estes que não têm maior respeito, se os que têm são quase todos e ainda dizem que os seus colegas têm menor respeito?
Daí surge a já conhecida hipótese do mecanismo psicológico de projeção dos problemas no “Outro”. No entanto, a força desta última interpretação é enfraquecida na ponderação de que o formulário foi divulgado para milhares de servidores e somente 158 deles se dispuseram a preencher, o que revela uma hipótese plausível de que talvez sejam mesmo pessoas mais interessadas, ainda que nada se possa comprovar de mais concreto a respeito do maior cumprimento delas em relação aos princípios administrativos.
2.5 Pesquisa jurisprudencial
Um levantamento das decisões do Supremo Tribunal Federal, com base nas palavras- chave “regime jurídico único” resultou em 154 acórdãos, uma súmula, 1321 decisões monocráticas, 16 decisões da Presidência, uma questão de ordem e três recursos extraordinários com repercussão geral. Não se identificou súmula alguma vinculante sobre o tema.
Dos 154 acórdãos existentes sobre o tema, apenas 28 são posteriores ao julgamento da ADIn 2.135-4. Desses 28 acórdãos, apenas 16 tratam do “regime jurídico único” em seu texto, os demais apenas fazem referência ao regime jurídico único na indexação do acórdão.
Os 16 acórdãos que tratam diretamente do tema demonstram um descompasso em relação ao que normalmente se entende sobre a restauração do regime jurídico único pela ADIn 2.135, havendo diversos posicionamentos, muitos deles incoerentes, principalmente no tocante ao que estava sendo restaurado – o regime celetista homogêneo ou estatutário.
Cumpre ressaltar que na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2135/ DF, julgada em 02/08/07, o Supremo Tribunal fixou o entendimento que: “A matéria votada em destaque na Câmara dos Deputados no DVS nº 9 não foi aprovada em primeiro turno, pois obteve apenas 298 votos e não os 308 necessários. Manteve-se, assim, o então vigente caput do art. 39, que tratava do regime jurídico único, incompatível com a figura do emprego público 2.
O deslocamento do texto do § 2º do art. 39, nos termos do substitutivo aprovado, para o caput desse mesmo dispositivo representou, assim, uma tentativa de superar a não aprovação do DVS nº 9 e evitar a permanência do regime jurídico único previsto na redação original suprimida, circunstância que permitiu a implementação do contrato de emprego público ainda que à revelia da regra constitucional que exige o quorum de três quintos para aprovação de qualquer mudança constitucional. 3. Pedido de medida cautelar deferido, dessa forma, quanto ao caput do art. 39 da Constituição Federal, ressalvando-se, em decorrência dos efeitos ex nunc da decisão, a subsistência, até o julgamento definitivo da ação, da validade dos atos anteriormente praticados com base em legislações eventualmente editadas durante a vigência do dispositivo ora suspenso. 4. Ação direta julgada prejudicada quanto ao art. 26 da EC 19/98, pelo exaurimento do prazo estipulado para sua vigência. 5. Vícios formais e materiais dos demais dispositivos constitucionais impugnados, todos oriundos da EC 19/98, aparentemente inexistentes ante a constatação de que as mudanças de redação promovidas no curso do processo legislativo não alteraram substancialmente o sentido das proposições ao final aprovadas e de que não há direito adquirido à manutenção de regime jurídico anterior. 3
Interessante registrar que, no Agravo Regimental no Recurso Extraordinário nº 507153/MG, julgado em 3/6/2008, entendeu o Supremo Tribunal Federal que “a Justiça comum é competente para julgar a reintegração de servidor público, mesmo que tenha sido regido pela Consolidação de Leis do Trabalho [CLT], demitido antes do advento do Regime Jurídico Único”.
Já nos Agravos Regimentais em Recurso Extraordinário nº 576.397/DF, julgado em 30/10/2012, nº 430.842/RS, julgado em 27/03/2012, e nº 436.530/DF, julgado em 15/12/2009, fixou o Supremo Tribunal Federal o entendimento “no sentido de que os efeitos da sentença condenatória proferida na Justiça do Trabalho limitam-se à data da instituição do regime jurídico único”.
No Agravo de Instrumento nº 456685/RS, julgado em 26/06/2012, o Supremo Tribunal Federal estabeleceu que “Ao servidor público Federal aposentado antes da instituição do regime jurídico único, regido pela Consolidação das Leis do Trabalho-CLT, aplica-se o regime geral de previdência social. Agravo regimental a que se nega provimento”.
No Agravo Regimental do Recurso Extraordinário nº 333246/RS, julgado em 08/11/2011, ficou estabelecido que “O servidor público Federal ou Estadual ex-celetista possui direito adquirido à contagem de tempo de serviço prestado sob condições insalubres ou perigosas no período anterior à instituição do Regime Jurídico Único”. No mesmo sentido, tem-se o Agravo Regimental no Recurso Extraordinário nº 408338/PR, o Agravo Regimental em Recurso Extraordinário nº 455479/SC, julgado em 27/10/2009 e o Agravo Regimental no Recurso Extraordinário nº 408338/PR, julgado, em 30/09/2008.
Já no Agravo Regimental do Recurso Extraordinário nº 583619/RO, julgado em 9/8/2011, fica estabelecido que É firme no Supremo Tribunal Federal o entendimento de que a Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar reclamação de servidor sujeito ao regime estatutário, mas apenas quanto ao contrato individual de trabalho celebrado antes da vigência desse regime. O advento da Lei 8.112/1990 estanca, de plano, a competência da Justiça especial.
No mesmo sentido, tem-se o Agravo Regimental no Recurso Extraordinário nº 481502/ DF, de 23/03/2011, e o Conflito de Competências nº 7.242/MG, julgado em 18/09/2008.
A súmula 678 do STF aprovada em 24/9/2003, única do Supremo Tribunal Federal que versa sobre regime jurídico único, dispõe que:
são inconstitucionais os incisos I e III do art. 7º da Lei 8.162/1991, que afastam, para efeito de anuênio e de licença-prêmio, a contagem do tempo de serviço regido pela consolidação das leis do trabalho dos servidores que passaram a submeter-se ao regime jurídico único
As decisões monocráticas e das turmas do Supremo Tribunal Federal sobre o regime jurídico mantêm o descompasso existente sobre o entendimento da restauração do regime jurídico único trazido pela ADIn 2.135 existente nos acórdãos da Corte.
Dentre as decisões monocráticas e das turmas, destacam-se a Reclamação nº 6.040/ MC, que questiona a contratação de professores celetistas como trabalhadores temporários dos quadros da Universidade do Estado do Amazonas, julgada em 2008, e o Recurso Extraordinário nº 507.536/DF, que aborda a imposição de regime jurídico único aos Conselhos de Fiscalização Profissional. Trata-se de decisão dissonante, por exemplo, da orientação do STF na ADIn 3.026, de relatoria do Ministro Eros Grau, em 8/6/2006, na qual se estabeleceu que “o regime estatutário imposto aos empregados da OAB não é compatível com a entidade, que é autônoma e independente”.
Um levantamento das decisões do Superior Tribunal de Justiça com base na palavra chave “regime jurídico único” resultou na seleção de 1.826 decisões, sendo que o sistema de pesquisa do tribunal não faz distinções entre acórdãos e decisões monocráticas. Da análise desses acórdãos, conclui-se que o entendimento do Superior Tribunal de Justiça também demonstra a existência de um descompasso sobre o entendimento da restauração do regime jurídico único trazido pela ADIn 2.135 do Supremo Tribunal Federal.
Destaca-se o Agravo Regimental no Conflito de Competência nº 115.400/SP, Rel. Min. Humberto Martins, que discutia se os efeitos da ADIn nº 2.135 restaurariam a justiça comum para julgar os efeitos de contratações de celetistas Municipais, quando da autorização da Emenda Constitucional nº 19/98, sendo decidido pela manutenção da questão na Justiça do Trabalho; decisão esta distinta daquela exarada no Agravo Regimental nº 117.756-RN.
Por fim, deve-se ressaltar que a súmula nº 173, do Superior Tribunal de Justiça, determina que “Compete à Justiça Federal processar e julgar o pedido de reintegração em cargo público Federal, ainda que o servidor tenha sido dispensado antes da instituição do Regime Jurídico Único”.
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DISCUSSÃO CRÍTICA E COMPLEXIDADES NA GESTÃO DE PESSOAL
Neste capítulo da pesquisa, serão feitas reflexões críticas sobre as complexidades da modernização administrativa na gestão pública de pessoal, em função das insuficiências dos rumos da última Reforma Administrativa. Também serão elencados, após a descrição dos trabalhos realizados no Seminário Gestão Pública dos Entes federativos: desafios jurídicos de inovação e desenvolvimento, os 35 pontos-síntese reflexivos sobre os Rumos da Gestão Pública Eficaz e o Direito Administrativo do Futuro.
3.1 Modernização e profissionalismo na Administração Pública: da incompletude da última Reforma Administrativa
O contemporâneo Estado Democrático de Direito encontra-se desafiado em suas estruturas pelas características da pós-modernidade. Muito embora este seja ainda um conceito em construção, sendo possíveis diversas leituras, desde as que a enxergam como uma elevação dos ideais modernos de desempenho, calculabilidade e valorização do indivíduo autônomo, até as que identificam uma significativa ruptura com tal modelo, a pós-modernidade imprime uma transformação nos ideais.
São ideais modernos em mutação pelas transformações sociais a crença na verdade, alcançável pela razão, e o fortalecimento do nacionalismo e a linearidade histórica rumo ao progresso, tendo sido o modelo de Modernidade influenciado pelas modificações provocadas principalmente pela Revolução Industrial.
Do ponto de vista da Administração Pública, a modernidade pode ser associada a três vertentes: (1) o taylorismo, com suas técnicas de organização industrial voltadas para o aumento da produtividade; (2) as noções reformistas da civil service reform de Woodrow Wilson, que se relacionavam com a separação entre política e administração; e, de forma mais aprofundada, (3) as formulações teóricas de Max Weber, expoente da sociologia clássica.
Frederick Winslow Taylor foi considerado o fundador da Administração Científica, ao pretender adequar as práxis administrativas aos métodos científicos cartesianos, com ênfase na necessidade de treinamento do pessoal, para que se produzisse mais e com maior qualidade. Nesta perspectiva, houve a racionalização do planejamento e da execução, com controle mecanicista do trabalho, para que ele fosse executado em sequência e tempo preestabelecidos, evitando desperdícios operacionais (TAYLOR, 1970).
A propósito de tal concepção, Becker (2001, p. 263) expõe que o aprofundamento do Capitalismo industrial redundou na ideia de aproveitamento máximo do tempo, com eliminação de ações desnecessárias e foco na noção utilitária de diligência (industry), defendida por Jeremy Bentham.
O utilitarismo influenciou o conceito de pagamento por produtividade dos operários, que teve repercussões práticas no segmento automobilístico, sendo paradigmático o método de racionalização aplicado por Henry Ford à sua linha automatizada, na qual as peças de veículos eram montadas por funcionários que se posicionavam próximos a esteiras rolantes. Tal fato foi, posteriormente, caricaturado por Charles Chaplin na obra prima do cinema Modern Times (1936).
Woodrow Wilson, contemporâneo de Taylor, expôs suas concepções reformistas de Administração Pública na obra O estudo da administração pública, de 1887, em que ressalta a necessidade de separação entre política e administração.
O trabalho de Wilson é considerado um marco no estudo da Administração Pública, pois, além de defender o prejuízo que a indistinção entre política e administração provoca em termos sociais, estendeu as regras de gerenciamento presentes na iniciativa privada para o universo das práticas públicas, na busca por maior eficiência.
Porém, foi Max Weber (1999) quem analisou as inter-relações entre Capitalismo e administração burocrática no Estado moderno. A partir da abordagem weberiana, é possível identificar o avanço da burocracia em relação às outras estruturas de poder, baseadas em tipos próprios de domínios (Herrschaft).
A burocracia veicula o domínio racional-legal, cuja obediência é associada à regra instituída, a qual submete também quem ordena. Os estatutos contemplam regras de competência determinadas por utilidade objetiva e especialização nas atividades. As condições do serviço são orientadas para a ascensão na carreira, sendo a remuneração estruturada em função da hierarquia do cargo. O serviço é permeado pela impessoalidade, na tentativa de afastamento do arbítrio.
O desenvolvimento das economias monetárias, o crescimento e a expansão das tarefas administrativas do Estado moderno e a maior eficiência da burocracia contribuíram para o desenho das seguintes características da burocracia moderna: (a) caráter legal das normas e regulamentos; (b) caráter formal das comunicações, baseadas em documentos ou atas; (c) racionalidade na divisão do trabalho; (d) impessoalidade nas relações; (e) hierarquia entre autoridades; (f) rotinas e procedimentos padronizados; (g) competência técnica e meritocrática; (h) especialização e profissionalização; e (i) previsibilidade do funcionamento.
Trata-se de concepção que acompanhou o florescimento de algumas das ideias basilares do Direito Administrativo, cujos principais institutos, inspirados em sua vertente originária francesa (sistema europeu-continental), também foram influenciados por tais noções (DI PIETRO, 2000).
No Brasil, o primeiro esforço de profissionalização do funcionalismo pode ser associado à criação do Departamento Administrativo do Serviço Público – Dasp –, que procurou, embora sem êxito total, substituir o nepotismo e o clientelismo predominantes pela da implantação de carreiras e cargos, treinamento e formação técnica dos funcionários, no intento de munir o Estado de um corpo de profissionais qualificados, a partir do estabelecimento do regime de pessoal.
Com a atuação do Dasp, mais cargos públicos passaram a ser escolhidos de acordo com critérios técnicos, sobretudo pela instituição dos primeiros concursos públicos de abrangência nacional, em substituição das indicações políticas mais características da República Velha e sua dinâmica coronelista. Também data da época a descentralização administrativa pela instituição de autarquias, na tentativa de conciliação do centralismo político, valorizado no Estado Novo, com o discurso oficial de modernização pela especialização de atividades.
Depois da criação do Dasp, no final da década de 30, deu-se, com a edição do Decreto- Lei nº 200/67, o movimento seguinte de Reforma Administrativa brasileira, no regime militar. Hélio Beltrão, então Ministro do Planejamento, foi incumbido de implementar a Reforma Administrativa de 1967, tendo sido, no entanto, frustrado, naquele momento, o refreamento do processo de expansão do Executivo Federal, tendo em vista a sistemática de criação de inúmeras estatais.
As décadas de 60 e 70 foram marcadas pela proliferação de grandes empresas estatais direcionadas para o desenvolvimento de setores da economia considerados de interesse nacional. Isto aconteceu em virtude de um projeto de desenvolvimento e soberania econômica, com vistas também à segurança nacional, uma preocupação intrínseca ao regime militar de então.
Enquanto a práxis militar foi inequivocamente centralizante, Hélio Beltrão defendeu a substituição do Estado burocrático por uma estrutura mais leve de programação, supervisão e fiscalização; advogando a substituição direta de serviços públicos pelos contratos ou mesmo convênios controlados pelo Poder Público. Por isso, costuma-se dizer que o germe do dito modelo gerencial no Brasil já é encontrado antes mesmo da década de 90. Contudo, a prática foi divorciada do discurso oficial reformista.
No Brasil, as medidas que propugnavam os objetivos de retração do Estado tiveram eco na adoção do modelo gerencial por meio do Plano Diretor de Reforma do Aparelho do Estado, sendo este inspirado nas práxis da New Public Management, adotadas principalmente nos
países do sistema Common Law. O discurso oficial reformista apoiou-se na governança, considerada como capacidade de governo do Estado, e apontou a burocracia estatal como causa da ineficiência na implementação das políticas públicas.
Daí decorreram intentos de alteração no regime jurídico das carreiras públicas, sendo muitas delas frustradas pelo desenho constitucional do regime jurídico dos servidores. Algumas tentativas, principalmente àquelas veiculadas pela Emenda Constitucional nº
19/98, lograram aprovação, por exemplo, à flexibilização da estabilidade a partir da inclusão da possibilidade de demissão por insuficiência na avaliação periódica de desempenho, desde que prevista por lei complementar, ou mesmo a perda do cargo por excesso de gastos com o funcionalismo, nos limites ditados pela Lei de Responsabilidade Fiscal.
Outras modificações, como o fim do regime único, conforme visto, só não se consolidaram na prática por vício de inconstitucionalidade formal, o que provocou o refreamento do ímpeto reformista que recaiu sobre a Força de Trabalho da Administração Pública da década de noventa.
Costuma-se identificar que, apesar de bem-intencionada, a Reforma acabou privilegiando, na prática, a faceta de enxugamento da máquina, em que a preocupação maior não era apenas com o desempenho dos servidores, mas principalmente com os custos, embasada na noção da New Public Management de work better e cost less.
Houve, portanto, um inequívoco conflito entre muitas das ideias propugnadas pelo modelo gerencial e o modelo constitucional, sendo que o Governo da época pretendia realizar transformações no funcionalismo rumo à eficiência sem que vertesse recursos compatíveis, tendo o Ministério da Administração e Reforma do Estado (Mare) sido extinto justamente no momento em que seriam feitos os investimentos necessários para a melhor capacitação dos servidores públicos.
3.2 Direito Administrativo e complexidades da gestão pública de pessoal
A Constituição de 1988 atribuiu, no art. 39, originariamente à União, Estados, Distrito Federal e Municípios, no âmbito de suas competências, um regime jurídico próprio e de planos de carreira para os servidores da Administração Pública direta, autárquica e fundacional. A Reforma Administrativa da década de noventa, por meio da Emenda Constitucional nº 19/98, tentou extinguir o regime único, no intuito de disseminar também a adoção do regime celetista na já citada Administração.
O regime jurídico único dos servidores públicos da Administração direta, autárquica e fundacional, que estava originariamente previsto no art. 39 da Constituição Federal, foi, no entanto, restaurado pela ADIn 2.135, que suspendeu, com efeitos ex nunc, como normalmente ocorre nas cautelares em ações de inconstitucionalidade, a eficácia da redação dada pela Emenda Constitucional nº 19/98, que pretendia suprimir a exigência de unicidade no regime.
Contudo, conforme foi demonstrado na pesquisa jurisprudencial, mesmo com a restauração do regime único, ainda subsistem discussões doutrinárias sobre qual o seu alcance. O sistema único contempla uniformidade, mas, além dos cargos efetivos, há cargos em comissão, de livre nomeação e exoneração.
Não é tarefa fácil, conforme enfatizado, analisar a gestão da Força de Trabalho da Administração Pública, uma vez que, antes da elaboração de qualquer proposta, deve-se estar ciente das peculiaridades da autonomia constitucional conferida aos entes federativos e também da presença de entes da Administração Indireta que se subordinam ao regime jurídico público.
Contudo, apesar das complexidades existentes, a discussão é profícua, uma vez que faz parte das tendências da Contemporaneidade a exigência de maior qualidade no atendimento do usuário do serviço, sendo exigido do gestor que tenha um desempenho (performance) que garanta a melhoria constante, aspecto que é intrinsecamente relacionado à disciplina do regime jurídico do servidor.
Conforme identificado, é desafiador, no diálogo entre a gestão pública da Força de Trabalho e o Direito Administrativo, aferir os paradigmas modernos relacionados à impessoalidade e, por decorrência, à ausência de subjetivismos (que o Direito Administrativo demanda dos agentes públicos), com aspectos comportamentais, os quais são levados em consideração pelas mais avançadas teorias motivacionais da Ciência da Administração.
Foi dito nas considerações introdutórias que a Teoria do Órgão, desenvolvida originariamente por Otto Gierke, considera o agente público como manifestação por imputação de uma vontade impessoal do Estado, pautada tão somente na lei. Este mito de neutralidade na ação estatal deve ser (re)pensado a partir de uma perspectiva mais ponderada e razoável.
O agente público representa, sem dúvida, a longa manus estatal, e sua ação deve se pautar na lei; de fato, é preferível, do ponto de vista do princípio republicano, o governo das leis ao governo “dos homens”. Também não se descarta a importância da conhecida frase de Seabra Fagundes4, no sentido de que “administrar é aplicar a lei de ofício”. Contudo, tais ideias não podem ser radicalizadas, pois tanto o Governo quanto a Administração são tocados por homens concretos, isto é, por agentes públicos que, sem dúvida, devem tomar decisões observando os limites das leis.
Se a gestão deve ser feita observando os comandos legais, também a Lei não é capaz de pormenorizar todas as condutas possíveis de serem adotadas diante de cada caso concreto, daí a existência da discricionariedade administrativa na maioria dos casos. Assim, mesmo dentro da observância da moldura jurídica, a ação do agente público pode ser feita de forma mais ou menos eficaz ao atingimento dos fins do Estado, a depender de fatores extrajurídicos, como, por exemplo, as condições materiais, as circunstâncias fáticas e até aspectos relacionados com o grau de motivação e comprometimento do agente público, que até recentemente não foram analisados com maior detença pelo Direito Administrativo.
Estes últimos fatores, de ordem mais subjetiva, não podem ser de todo ignorados quando se fala em estimular melhor desempenho, isto é, mais eficiente na função administrativa. A partir da positivação do princípio da eficiência no rol dos princípios constantes do art.
37 da Constituição, pela Emenda Constitucional nº 19/98, a performance dos servidores passa a ser também uma questão jurídica, tendo em vista o fato de que os princípios são considerados, no Estado Democrático de Direito, determinações com força normativa.
O Direito, que serve para regular comportamentos humanos, não ignora que há sanções que são premiais e que estimulam determinadas atitudes. Ademais, a Administração Pública tanto será mais eficiente, em regra, quanto mais estimulante for a ambiência do trabalho; não sendo, por outro lado, estimulante a difusão da imagem do servidor como uma peça substituível de uma engrenagem com vida própria.
Na realidade, o desenvolvimento da Teoria do Órgão, por Otto Gierke, visava explicar qual a natureza do vínculo do agente público com o Estado, que não seria de representação e tampouco de mandato, servindo, ainda hoje, para validar pequenas irregularidades praticadas, como, por exemplo, problemas na investidura do servidor (na aplicação conjunta com a formulação denominada de funcionário de fato). Contudo, esta elaboração não auxilia a estimular o agente público para uma ação mais eficiente.
A ideia não é tentar suprimir a Teoria do Órgão – pois ela tem sua utilidade na área do questionamento da validade dos atos administrativos –, mas apenas ponderá-la, no diálogo com a gestão pública, na certeza de que enxergar o agente público como um anônimo que desempenha funções pré-programadas não é visão apta a estimular uma gestão eficaz da Força de Trabalho dos órgãos administrativos.
A teoria estatutária, de raízes organicistas, conforme expõe Roberto Sorbilli Filho (2009, p. 395), já despertava algumas preocupações de Dromi, que temia a concepção da estrita verticalidade entre o Estado e seus agentes, enfatizando, portanto, a necessidade de separar o elemento objetivo do órgão, relativo ao conjunto de atribuições institucionais da repartição estatal, do elemento pessoal e variável, encarnado na figura humana.
A visão corrente, que apregoa a situação estatutária objetiva, em que as funções já estão todas delimitadas a priori, não é apta a estimular, portanto, no agente público a percepção de que também a sua iniciativa individual, o seu talento e a sua criatividade são fatores fundamentais para a eficiência do funcionamento da Administração Pública.
Não é exagerado, nesta perspectiva, dizer que viola parcela da dignidade do agente público, como ser humano que é, considerá-lo desta forma. Dignidade humana, de acordo com a exposição de Ingo Wolfgang Sarlet, é a qualidade peculiar e insubstituível da pessoa humana. Conforme exposição retirada de Kant: “quando uma coisa tem um preço, pode pôr-se em vez dela qualquer outra como equivalente; mas quando uma coisa está acima de todo o preço, e portanto não permite equivalente, então ela tem dignidade.”5
Em suma, uma grande complexidade a ser enfrentada por um Direito Administrativo afinado com a gestão pública é justamente considerar a dignidade do servidor público, sem que isso implique em pessoalidade ou subjetivismo; genuinamente, apenas, considerá-lo um ser humano único, assim como todas as demais pessoas, e que, como regra geral, tanto mais será envolvido quanto exercer suas atribuições com de talento e comprometimento.
3.3 Reflexões sobre Direito e Gestão: Seminário
Gestão Pública dos Entes federativos
O objetivo de realização do seminário Gestão Pública dos Entes federativos: desafios jurídicos de inovação e desenvolvimento foi incentivar a reflexão e o debate conjunto de juristas, gestores e demais pessoas com expertise nas áreas multidisciplinares que considerassem as complexidades da gestão pública diante de aspectos como: Federalismo, limites de inovação dentro das possibilidades do regime jurídico e modernização com desenvolvimento.
Procurou-se romper com a “Torre de Babel” que representa o embate entre administrativistas e tecnocratas e promover um encontro de visões para intercâmbio de entendimentos e reflexão conjunta das complexidades da gestão pública da Força de Trabalho nos entes federativos, a partir de análises criteriosas e científicas.
O seminário ocorreu nos dias 3, 4 e 5 de outubro de 2012 no campus Memorial da Universidade Nove de Julho, em São Paulo. Estiveram presentes palestrantes de outros Estados, como Juarez Freitas, do Rio Grande do Sul, e Emerson Gabardo, do Paraná.
A Secretaria de Assuntos Legislativo do Ministério da Justiça deu substancial apoio ao seminário, que foi verdadeiramente uma realização conjunta. Houve a presença de Junia Marília Pimenta Lages, que integrou a mesa da tarde do dia 4 de outubro de 2012, e as exposições de Nayara Teixeira Guimarães, na abertura do evento, e do Secretário Marivaldo de Castro Pereira, cuja palestra foi feita no encerramento do seminário. Também esteve presente e atuante Priscila Spécie.
A proposta do seminário foi resumida da seguinte forma, divulgada no site criado para o evento:
O evento sobre Gestão Pública dos entes federativos pretende reunir análises sobre os obstáculos fáticos e jurídicos à inovação e ao desenvolvimento de uma cultura de capacitação da Força de Trabalho das Administrações Públicas dos entes federativos. Parte-se da noção de que a pretensão de modernização, que acompanha o desígnio universal de que o Estado atue de forma mais eficiente, deva ser harmonizada com um projeto de desenvolvimento sustentável que respeite os direitos e a dignidade da Força de Trabalho das Administrações Públicas. Para tanto, serão enfrentadas as complexidades existentes, tendo por foco a aproximação entre a abordagem das vicissitudes e desafios da gestão pública, diante de um novo paradigma de Direito Administrativo. Objetiva- se, a partir da análise e discussão conjunta, promover um encontro da gestão pública com o direito, para que se debata, sob o viés federativo, um modelo apropriado de modernização administrativa que a sociedade civil, os governos e a comunidade acadêmica pretendam tornar realidade, evitando-se tanto que o direito público seja visto como obstáculo às necessidades da gestão, como que a gestão pública seja estabelecida à margem do direito.6
O seminário objetivou, ainda, congregar alguns dos referenciais teóricos da presente pesquisa para dialogar sobre gestão. As palestras foram filmadas e gravadas. Houve transmissão ao vivo pela TV Uninove. O acervo documental (que inclui vídeo e transcrição das palestras em forma de anais) será entregue à Secretaria de Assuntos Legislativos como produto da pesquisa.
O primeiro dia abarcou a discussão da gestão pública sob o eixo multidisciplinar, tendo por base aspectos econômicos, históricos, jurídicos e administrativos. Houve a exposição de Maria Sylvia Zanella Di Pietro, titular em Direito Administrativo pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, sobre Gastos com Pessoal e a Lei de Responsabilidade Fiscal. Trata-se, pois, de aspecto primordial ao investimento na capacitação da Força de Trabalho das diversas Administrações Públicas a compreensão das limitações contidas na legislação, ainda que seja para dar sugestões de alterações legislativas neste âmbito.
Na sequência, houve a exposição de Nildes Pitombo, Doutora em Administração, professora do programa de mestrado em Administração da Universidade Nove de Julho e tutora do programa PET da Universidade Nove de Julho, sobre Gestão Pública Estratégica e Comportamento Organizacional, na qual houve, entre outros assuntos, o relato de pesquisa empírica feita com a polícia militar na Bahia e dos resultados acerca do comprometimento dos policiais militares com as estruturas organizacionais do Poder Público.
Após o intervalo, a mesa foi composta por três expositores. Sucedeu a esta a exposição de José Reinaldo de Lima Lopes, Professor Livre-Docente da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo e da Fundação Getúlio Vargas, acerca das Transformações da Burocracia Brasileira: do ofício ao cargo público, na qual houve uma rica abordagem sobre como se estruturaram as carreiras públicas paulatinamente, de forma diferenciada nos Poderes, sendo enfatizados os valores burocráticos da especialização e profissionalismo ante os avanços e continuísmos históricos.
Na sequência, Fernando de Souza Coelho, coordenador da graduação em Gestão de Políticas Públicas da Universidade de São Paulo e do programa de Mestrado em Sistemas Complexos, tratou das Complexidades da Gestão de Pessoas no Setor Público, dando ênfase às abordagens não fragmentárias que preencham necessidades de variados âmbitos de análise da gestão de pessoas na área pública. Foram enfocadas as práticas exitosas em diversas estatais, tendo sido fornecidas sugestões preciosas para que as carreiras públicas não sejam engessadas frente às transformações aceleradas nas relações sociais.
Emerson Gabardo, professor de Direito Econômico do Programa de Mestrado e Doutorado da Pontifícia Universidade Católica do Paraná e de Direito Administrativo na Universidade Federal do Paraná, abordou o Papel do Estado e Mito da Subsidiariedade. Expôs, entre outras questões levantadas, que o pretenso princípio da subsidiariedade, que indica uma atuação meramente supletiva do Estado no domínio econômico, não se coaduna com a ordem econômica da Constituição de 1988, sendo melhor que o Estado não se retraia em seu múnus constitucional de realização dos direitos sociais.
O período noturno foi reservado às exposições de Nayara Teixeira Magalhães e de Gilberto Bercovici, titular do Departamento de Direito Econômico da Universidade de São Paulo, sobre a modernização do Estado com enfoque no desenvolvimento. A exposição seguinte foi de Irene Patrícia Nohara, coordenadora do projeto, sobre o Balanço da Reforma Administrativa: redefinição do diálogo entre Direito e Gestão.
Nayara Teixeira Magalhães, consultora acadêmica do Projeto Pensando o Direito, expôs a importância das pesquisas realizadas pela Secretaria de Assuntos Legislativos a propósito do Projeto Pensando o Direito com relatos pormenorizados dos resultados dos projetos ao longo de seu funcionamento. Na sequência, complementando tais explicações, Irene Patrícia Nohara enfatizou as características do projeto que estava sendo desenvolvido na Universidade Nove de Julho a propósito do edital 1/2012, sobre modernização e transparência da Administração Pública, saudando a presença dos pesquisadores da equipe, e associou a atual pesquisa com um balanço sobre as três grandes reformas do Estado vivenciadas pelo Brasil no século XX. Enfatizou que o momento é propício para a rediscussão do papel do Estado, tendo em vista as transformações que a sociedade nacional e a internacional estão vivenciando na atualidade (principalmente após 2008, quando a crise eclipsou de vez a pretensa eficácia do receituário neoliberal às economias centrais).
O segundo dia de seminário iniciou-se com a exposição de Wallace Paiva Martins Junior, Doutor em Direito Administrativo, promotor de Justiça e assessor do Procurador-Geral de Justiça de São Paulo, a respeito do Panorama do Regime de Remuneração dos Servidores Públicos. Foi feita uma elucidativa apresentação sobre diversos aspectos do regime de remuneração da Força de Trabalho da Administração Pública, assunto relacionado com a presente pesquisa.
Na sequência, houve a apresentação de Clóvis Bueno de Azevedo, professor do Departamento de Gestão Pública da Escola de Administração de Empresas da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo, sobre os Desafios de (Re)regulação dos Servidores Públicos, a qual ressaltou a necessidade de interpretação razoável das regras de Direito Administrativo dentro do escopo de servir aos objetivos maiores (interesse público primário) da gestão pública. Foram de acentuada importância prática as observações feitas pelo professor a propósito do aprimoramento da gestão, no tocante à forma como é regulada a matéria dos servidores públicos, sendo diversas das questões debatidas incorporadas aos pontos apresentados como resultado das reflexões do seminário.
Após o intervalo, o segundo painel do dia 4 de outubro de 2012 foi aberto com a apresentação do professor Dalmo de Abreu Dallari, emérito da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, na qual houve a exposição das características e origens do Federalismo, diante das novas descobertas de suas pesquisas – com a leitura dos documentos históricos. Deu-se a desmistificação de várias questões envolvendo os chamados founding fathers. Dallari ressaltou, ainda, na palestra intitulada Federalismo, Gestão Democrática e o Futuro do Estado, que, quando ocupou o cargo de Secretário de Negócios Jurídicos da Municipalidade, logo no início do desempenho da função, enfatizou que a Secretaria seria muito mais o local do “como pode ser feito”, do que do simples “não pode”, pois é indispensável que haja esforço de realização dos projetos dentro das possibilidades jurídicas existentes, o que demanda mais do que a singela postura reativa identificada comumente na área jurídica.
Na sequência, ocorreu a palestra de Dinorá Musetti Grotti, professora Doutora em Direito Administrativo na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, sobre a Problemática da Greve no Serviço Público. Houve uma rica e pormenorizada apresentação sobre todo o histórico da ausência de regulação da greve no serviço público, enfatizando as decisões judiciais aplicáveis e soluções equilibradas para esta questão, que é tão cara à gestão da Força de Trabalho das Administrações Públicas.
A terceira exposição de painel foi a de Roberto Correia da Silva Gomes Caldas, professor Doutor em Direito Administrativo pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, sobre o Retorno do Regime-Jurídico Único: alcance e efeitos. Deu-se ênfase aos efeitos do retorno do regime jurídico único após decisão ex nunc do Supremo Tribunal Federal e à persistência na indefinição dos alcances e sentidos.
Após a abertura da exposição noturna, feita pelo diretor do Curso de Direito da Universidade Nove de Julho, Sérgio Pereira Braga, com a participação do coordenador do Programa de Mestrado em Direito da Universidade, Vladmir Oliveira da Silveira, houve a palestra de Juarez Freitas, professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e presidente do Instituto Brasileiro de Altos Estudos de Direito Público, acerca do Direito à Boa Administração e Gestão Pública Eficaz.
Asseverou Juarez Freitas7 que a Administração Pública deve ser orientada para a eficácia da ação de gestão governamental, sendo que “toda Constituição democrática pretende estabelecer políticas determinadas, cuja concretização cabe aos entes federativos implementar. Elas já estão formuladas na Constituinte!”. O jurista partiu, então, para a atual e instigante abordagem da eficácia dos direitos fundamentais a partir de ações concretas de gestão eficaz, como o saneamento e o atendimento de qualidade nas creches, tendo por foco um ativismo constitucional sem retrocessos.
No dia 5 de outubro de 2012, teve lugar, das 14h às 18h30, no auditório do Mestrado da Universidade Nove de Julho, o Mini-Fórum de Escolas de Governo/Administração, que contou com a presença de autoridades e estudiosos com expertise em capacitação de servidores públicos.
O encontro teve por objetivos centrais ouvir o relato da experiência dos palestrantes convidados e promover uma interlocução a propósito do assunto na discussão sobre os pontos levantados pelos palestrantes dos painéis dos dias anteriores, que foram, ao final, projetados e discutidos com os participantes.
Participaram ativamente do minifórum: Gustavo Ungaro, Corregedor-Geral da Administração do Estado de São Paulo; Fábio Mauro de Medeiros, Diretor do Centro Regional da Escola de Administração Fazendária em São Paulo; Regina Hirose, Diretora do Centro de Estudos Jurídicos – Cejuris do Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional; e Maria de Fátima Infante Araújo, Doutora em Economia Aplicada pela Unicamp e ex-Diretora de Formação de Servidores da Fundap.
Ao término do minifórum, houve, conforme dito, a apresentação e discussão dos pontos- síntese de uma gestão pública eficaz, extraídos das palestras anteriores do seminário. Fábio Mauro de Medeiros apontou que, mesmo que se discuta a discricionariedade ou vinculação da ação administrativa, do ponto de vista prático, a criação de processos eletrônicos, tendência atual, deve ser feita de forma a não transformar decisões administrativas que seriam discricionárias em vinculadas e nem obstar a motivação particularizada dos atos. Por motivo desta observação, houve a inserção do ponto nº18 no documento: “É preciso compatibilizar os sistemas informatizados com a necessidade de uma decisão ponderada, respeitando a exigência de motivação dos atos”.
O minifórum procurou levantar mais dados para a reflexão dos assuntos pesquisados, a partir do debate dos obstáculos e das problemáticas da gestão pública, intentando articular também parte do setor público organizado, a partir da exposição de suas reivindicações, dentro do contexto dos mecanismos jurídicos existentes, e dos possíveis aperfeiçoamentos ante necessidades cotidianas da gestão da Força de Trabalho de distintos entes federativos. Ocorreu, portanto, uma abordagem mais prática do que propriamente teórica.
Foram também identificadas algumas tendências dos cursos de capacitação da atualidade, tendo sido dito que os servidores públicos estão preferindo cursos específicos e moldados para esclarecer problemas práticos enfrentados para cada tipo de carreira, além dos tradicionais cursos genéricos oferecidos pelas Escolas de Governo/Administração. Isto foi associado ao fato de que as rápidas transformações legislativas na área do Direito Administrativo estão provocando algumas incertezas em relação às novas formas de gestão pública; assim, há uma significativa demanda por atualização profissional em assuntos pontuais, como a Lei de acesso à informação ou alguma legislação fiscal que transforme a forma de cobrança, entre outros.
O encerramento do seminário contou com a palestra do Secretário de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça Marivaldo de Castro Pereira, que expôs as ações transformadoras da Secretaria de Assuntos Legislativos na discussão dos projetos de lei relevantes, a exemplo da inovadora construção democrática, por consulta popular eletrônica, do Marco Civil da Internet. A ênfase da apresentação do Secretário foi a Democratização da elaboração legislativa, tendo em vista as recentes inovações da área.
Por fim, foram lidos por Samantha Ribeiro Meyer-Pflug os pontos de reflexão, inspirados em facetas de assuntos discutidos pelos expositores do seminário, os quais, conforme dito, foram submetidos à interlocução no minifórum de Escolas de Governo/Administração.
Os pontos elencados não expressam a opinião isolada de qualquer de seus participantes, mas são resultado do esforço da equipe de pesquisa no sentido de sumarizar algumas conclusões gerais extraídas dos três dias de trabalho do seminário.
Os Pontos da Gestão Pública Eficaz e Direito Administrativo do Futuro são
- É questão pressuposta na modernização da estrutura da Administração Pública: a discussão do papel que legitimamente se espera na atualidade do Estado;
- A Constituição de 1988 contempla diretrizes do papel do Estado;
- A aplicação prática do Direito Administrativo, que depende de uma boa gestão pública, deve ser voltada à máxima eficácia dos direitos fundamentais constitucionais;
- O Estado Democrático de Direito, enunciado e garantido na Constituição de 1988, ainda não foi despido de sua função jurídica de promotor dos direitos sociais, muito embora esta seja uma concepção dinâmica e que possui seus condicionamentos;
- O Terceiro Setor tem inquestionável relevância, devendo ser fomentado pelo Governo;
- As atividades de caráter voluntário da sociedade civil organizada, que são importantes e úteis, não devem ser confundidas com o pleno exercício dos direitos sociais;
- Os serviços públicos, que veiculam direitos subjetivos sociais, conferem aos beneficiários o status de cidadania, o que inclui o dever e a responsabilidade de exigência criteriosa aos prestadores, sejam eles a Administração Pública ou os seus delegatários;
- Os prestadores de serviços públicos não o fazem em caráter voluntário, isto é, apesar de todos os condicionamentos orçamentários existentes, ainda assim existe um grau de exigibilidade, que não pode ser delimitado a priori, do cumprimento destas obrigações;
- A eficiência da “Força de Trabalho” da Administração Pública é fator que não depende só de sua formação, mas também da ambiência na qual se desenvolvem as funções, pois um ambiente de trabalho estimulante é um dos pilares para que haja o maior comprometimento dos envolvidos;
- Algumas estatais possuem práticas inovadoras, sendo “nichos de excelência” em gestão; tal fato é associado à adaptação de seus programas de capacitação, nos últimos vinte anos, ao desenvolvimento de competências e habilidades mais profissionais e especializadas;
- Identifica-se também um processo de melhoria da prestação de serviços públicos por parte da Administração Direta, sendo este processo em parte inspirado em práticas de estatais que implantaram alguns programas de qualidade;
- Não se confundem os valores burocráticos de especialidade e profissionalismo, que atribuem à Administração maior eficiência, com o sentido pejorativo que a palavra burocracia adquiriu, sendo este último significado associado ao distanciamento e à indiferença;
- O Direito Administrativo, com suas notas características de formalismo e impessoalidade, corolários do princípio republicano e da consequente meritocracia, contribuirá melhor para o alcance da eficiência quando for também permeável à perspectiva comportamental da gestão pública: considerando, com ponderação em relação aos mencionados valores, o estímulo à liderança e ao comprometimento como meios adequados ao alcance da gestão pública eficaz;
- A liderança e o comprometimento não podem ser impostos por treinamentos motivacionais violadores da dignidade humana e do discernimento crítico, pois as pessoas apenas se envolvem naquilo que espontaneamente elegem como prioritário em decisões pessoais, sendo esta uma questão de foro íntimo;
- Há programas de capacitação que repetem conteúdos já exigidos no ingresso na Administração Pública, sem trabalhar de forma mais dinâmica as habilidades necessárias para o estímulo de um profissional comprometido e eficiente;
- Rigor para discernir é fundamental à boa gestão, pois em determinados contextos, é indispensável ao respeito de princípios administrativos;
- A boa gestão não se constitui apenas de precisão técnica, mas também é relevante o desenvolvimento da habilidade do discernimento, com uso do bom senso, para afastar formalismos inócuos que dão maior ênfase ao cumprimento por si só de regras do que ao alcance das finalidades de atendimento das necessidades públicas;
- É preciso compatibilizar os sistemas informatizados com a necessidade de uma decisão ponderada, respeitando a exigência de motivação dos atos;
- Do ponto de vista do alcance da eficácia, na discussão sobre eficiência: os fins não justificam os meios, pois apesar de os meios serem instrumentais, alguns fins só são garantidos e/ou assegurados com meios adequados;
- A questão da “flexibilização dos controles” deve ser revista sob pressupostos mais complexos, pois um bom resultado é alcançável com o controle de um procedimento de qualidade, tanto no Poder Público como na iniciativa privada;
- Não é possível a avaliação completa de um processo sem que se olhe para ele como algo dinâmico, pois a “ênfase nos resultados” pode esconder falhas procedimentais que podem ser aprimoradas, caso se controle todas as etapas do procedimento;
- A visão do controle do procedimento com foco exclusivo na identificação de falhas para a punição dificulta a possibilidade de aprimoramento das práticas administrativas;
- É mais eficiente ao desenvolvimento das organizações, tanto públicas como privadas, que o controle assuma suas feições preventivas e orientadoras, afastando-se da burocracia parcela da culpa, do medo e, consequentemente, da ausência de transparência;
- Os sistemas de avaliação de desempenho devem se voltar à melhoria das relações na organização: o enfoque jurídico deve se deslocar da exclusividade da avaliação como forma de controle e punição, para um instrumento de mapeamento e orientação dos “gargalos” de ineficiência;
- A forma com que são criados muitos cargos, sem carreiras mais abertas, dificulta a adaptação às transformações sociais;
- Na ascensão da carreira pública deve haver formas mais objetivas de premiação dos servidores engajados e comprometidos, dentro de critérios meritocráticos;
- A plena eficácia dos princípios da prevenção e da precaução nas atividades do Estado depende também do refinamento do juízo do gestor para a fiscalização do momento anterior à ocorrência do dano, o que pressupõe controle preventivo e concomitante;
- Há uma dinamicidade nas expectativas em relação à atuação do Estado, em função das rápidas transformações sociais e tecnológicas, que reforça a necessidade de uma gestão pública eficaz;
- Um dos grandes desafios da atualidade é imprimir uma ação eficiente à máquina administrativa para evitar riscos, antes que os prejuízos aconteçam, sendo esta uma questão de abordagem multidisciplinar;
- Também a discussão sobre a mudança na estruturação das carreiras públicas deve ser focada em função de sua complexidade, pois há inúmeros fatores envolvidos: econômicos, jurídicos, administrativos, psicológicos e políticos;
- A complexidade deve ser discutida, mas não deve ser utilizada como argumento impeditivo do aprimoramento das práticas da gestão pública que, para ser eficaz, deve pressupor, além do planejamento criterioso, periodicamente revisto e ponderado, também uma execução criteriosa;
- É preciso capacitar ainda os agentes que executam, que devem compreender a mentalidade do plano Ideal que o treinamento envolva todos, tanto os que elaboram os planos, como os que executam as tarefas deles derivadas, pois de nada adianta o servidor público fazer a capacitação e sua chefia não estimular a aplicação prática dos novos conhecimentos adquiridos;
- As mudanças não ocorrem só de cima para baixo, a partir de reformas legislativas, muito embora em diversos casos sejam indispensáveis, mas há práticas inovadoras que promovem eficiência de baixo para cima (bottom-up);
- O Projeto Pensando o Direito é um exemplo de prática inovadora, de interlocução e democratização na feitura das leis, pois a abertura à comunidade científica e à sociedade civil permite o debate criterioso já no nascedouro dos projetos, promovendo substrato crítico também para as propostas em trâmite; e
- O Direito Administrativo do futuro deve considerar as necessidades da gestão pública e a gestão pública não pode mais ser estabelecida à margem do Direito, para isto é indispensável que haja uma mudança de consciência de todos os envolvidos.
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PROPOSTA DA CRIAÇÃO DO PLANO DE GESTÃO DA FORÇA DE TRABALHO
O Plano de Gestão da Força de Trabalho representa um mecanismo jurídico de previsão constitucional, sendo obrigatório para todos os entes da Administração Pública, mormente da Administração direta, autárquica e fundacional, inspirado nas práticas orçamentárias e sujeito, portanto, a contínuas revisões em função das novas conjunturas de pessoal e das necessidades coletivas.
Sua principal peça compreende a formulação de um inventário pormenorizado da situação funcional dos servidores, sua qualificação, bem como capacitação, para orientação e deliberação sobre o uso racional dos recursos humanos presentes na administração brasileira, permitindo com que as políticas públicas sejam executadas em sintonia com a Força de Trabalho existente.
O plano é desdobrado em Anual e Plurianual de Gestão da Força de Trabalho. Ao Poder Legislativo cabe aprovar cotas de gestão de pessoas em função dos limites de servidores que cada unidade de gestão demonstre ter disponíveis para a programação da execução de suas políticas públicas.
Conforme exposto, esta é uma solução vislumbrada para minimizar o impacto do legado patrimonialista no uso dos cargos e funções públicas. O planejamento terá um grau razoável de abertura, o que significa que não acabará com a margem de discricionariedade dos órgãos de gestão, apenas fará com que eles compartilhem periodicamente com o Legislativo de suas ações estratégicas na área – sendo, inclusive, prevista a liberação de cotas destinadas a operações especiais. Também se objetiva articular o planejamento dos gastos e sua associação com deliberações prioritárias que ocorrem no âmbito da discussão orçamentária, com um planejamento estratégico da gestão da Força de Trabalho do Poder Público, na articulação com as normas previstas para os gastos com despesa de pessoal de todas as administrações dos entes federativos na Lei de Responsabilidade Fiscal.
Os Planos Anuais e Plurianuais de Gestão da Força de Trabalho integram projetos de iniciativa dos Chefes dos Poderes Executivos e são discutidos no âmbito dos respectivos Poderes Legislativos. A proposta de alteração normativa para criação de um Plano de Gestão da Força de Trabalho, de previsão genérica na Constituição e, a partir de projeto de lei, própria dos entes, com desdobramento em lei complementar naquela e alinhado com a discussão orçamentária nesta, deve imprimir maior sistematicidade e controle também aos planos de carreira, evitando-se a segregação dos respectivos estatutos.
Acredita-se que o planejamento nesta seara refrearia parcela do ímpeto patrimonialista na Administração Pública, promovendo, inclusive, maior controle nas contratações temporárias e na programação de concursos públicos, bem como no desligamento em massa e prejudicial à Administração de ocupantes de cargos em comissão qualificados tecnicamente e comprometidos com o bom desempenho de suas atribuições.
Evidentemente, os cargos em comissão serão ainda exoneráveis ad nutum, mas a discussão do plano permitirá estruturar paulatinamente um sistema em que os cargos em comissão sejam voltados efetivamente para funções de direção, chefia e assessoramento, e não para funções técnicas (próprias de carreiras), como não raro acontece nas Administrações Públicas brasileiras. Foram formulados, em suma, um Projeto de Lei Complementar e uma Proposta de Emenda à Constituição, sendo ambos anexados, na íntegra, na presente publicação.
A Proposta de Emenda à Constituição sugerida também prevê o mecanismo de avaliação periódica de desempenho que se volte ao desenvolvimento potencial dos servidores públicos. Trata-se de avalição cujos critérios continuarão a ser estabelecidos por Lei Complementar, que toma por base o equilíbrio de rendimentos quantitativos e qualitativos no cumprimento das metas estabelecidas em políticas públicas ou no exercício cotidiano das atribuições funcionais, conforme redação sugerida:
As avaliações periódicas de desempenho, cujos critérios gerais serão previstos em Lei Complementar, serão determinantes para o estabelecimento de uma cultura de meritocracia na Administração Pública, sendo as ascensões e promoções funcionais estabelecidas no equilíbrio entre os rendimentos quantitativos e qualitativos no desempenho das atribuições e no cumprimento das metas estabelecidas em políticas públicas. 8
A ideia é reconhecer a dignidade do servidor público e, por meio de avaliações abrangentes e voltadas ao desenvolvimento de habilidades e competências, estimular sua capacidade de iniciativa, seu talento, adaptabilidade, trabalho em equipe e criatividade como fatores também úteis ao desenvolvimento funcional da Administração Pública, preservando valores republicanos, como impessoalidade e isonomia, em função da razoabilidade.
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CONCLUSÃO
Em suma, as conclusões gerais da pesquisa foram:
- primeiramente, apesar de os estatutos dos servidores serem bastante padronizados, sobretudo pela sistemática constitucional conferida ao trato do assunto, submetidos aos estatutos existem milhares de planos de carreiras que, na maioria dos casos, se divorciam desta mesma sistematicidade, ou seja, não seguem padronização; assim, tendo em vista o emaranhado caótico deles, restou prejudicada a intenção pouco factível de cotejo de todos os variados planos de carreiras do universo dos 54 entes federativos pesquisados;
- após cinco meses de cobrança intensiva e desgastante por parte dos pesquisadores, apenas 14 entes forneceram os dados solicitados (alguns deles, de forma incompleta); assim, para suplementar os dados dos mapas de vinculações funcionais, houve a solicitação de informações ao IBGE, que disponibilizou dados de 2011 quanto aos Municípios, sendo diagnosticado no tocante às Capitais que: mais de 70% dos servidores da Administração Direta são estatutários, com destaque para os Municípios de São Paulo e do Rio de Janeiro, cujo número ultrapassa 90%; Palmas é a Capital que possui o maior número percentual de contratações de celetistas na Administração Direta, correspondente a 25,8%, sendo seguida por Goiânia (24,1%); e João Pessoa, segundo dados do IBGE, possui maior número percentual de contratações temporárias (49,5%), sendo maior até do que o percentual de vínculos estatutários (45,8%);
- dos Estados que apresentaram os dados, e, infelizmente, foram só quatro dos 26 Estados-Membros, isto é, somente 15,38% deles, o destaque é dado a Minas Gerais, pois foi o ente que mais rápida e eficientemente aceitou participar da pesquisa, sendo nele identificado um equilíbrio entre estatutários, temporários e admitidos estáveis;
- ademais, a pesquisa jurisprudencial demonstrou não haver parâmetros fixos nas decisões dos tribunais superiores quanto ao alcance e consequências do regime jurídico único restaurado pela ADIn 2135-4, o que gera insegurança em diversos assuntos, como, por exemplo, o regime de aposentadoria e a justiça competente para julgar os celetistas admitidos na Administração direta, autárquica e fundacional no interstício entre a extinção do regime jurídico único pela Emenda Constitucional nº 19/98 e sua restauração ex nunc pela mencionada ADIn de 2007;
- mesmo com dispositivos constitucionais que padronizam o trato de inúmeras matérias voltadas aos servidores, os dados empíricos evidenciam a necessidade de organização planejada da gestão dos entes, dada diversidade em grande parte dos assuntos, tais como: as variações de remunerações máximas, a duração da jornada de trabalho, a qualificação dos servidores (o que é compreensível, em geral, em função de o Brasil possuir em seu território disparidades na qualificação da mão de obra), o número de servidores promovidos. É indiciária desta mesma falta de organização o fato de algumas secretarias de gestão terem fornecido dados que foram relativizados na abordagem da pesquisa, como, por exemplo, um valor de remuneração de mínimo de 33,57 reais e de máximo de 76.000,00 reais, o que seria inconstitucional diante das existências respectivas de mínimo remuneratório e de teto constitucional;
- o formulário digital foi preenchido por 158 servidores: 78% estatutários; 68% com ensino superior completo, sendo que 78% estão insatisfeitos com as condições de trabalho, os dois motivos mais alegados para a insatisfação são a remuneração e a rotina desestimulante; 73% dão razão à afirmativa de que: “quem trabalha mais no serviço público, não tem o devido reconhecimento”, sendo a estabilidade o principal atrativo lembrado para a escolha da carreira pública; 41% declararam estudar para prestar outro concurso público e 74% dos servidores consideram os cursos de capacitação oferecidos pela repartição onde estão lotados péssimos ou insuficientes; 66% dos participantes acreditam que “faltam recursos humanos para atender a quantidade de trabalho cotidiana”; 65% acham que faltam também “recursos materiais para bem realizar o trabalho”, havendo um percentual maior e servidores que consideram injusto o discurso de que “o servidor público é menos eficiente do que os trabalhadores da iniciativa privada”;
- diante do cenário empírico, a equipe se voltou para a seguinte conclusão: é imperativo criar um mecanismo jurídico que torne realidade nacional o planejamento estratégico de recursos humanos no Poder Público;
- houve, então, a sugestão mais concreta e pormenorizada de criação do Plano de Gestão da Força de Trabalho, inspirado nas práticas orçamentárias, por meio de Proposta de Emenda à Constituição, sendo exigido de todas as Administrações Públicas dos entes federativos que periodicamente abram as “caixas pretas” de suas gestões de pessoal e que demonstrem haver articulação estratégica da Força de Trabalho com as atribuições funcionais dos servidores e com a realização das políticas públicas, circunstância em que será possível que o Governo se acople à Administração Pública, isto é, que a velocidade de funcionamento da máquina administrativa seja aferida, de forma dialogada e razoável, também em função de necessidades públicas consideradas prioritárias;
- para garantir uma padronização no trato da matéria, houve a sugestão de um Projeto de Lei Complementar que fixa parâmetros genéricos do estabelecimento dos Planos Anual e Plurianual de Gestão da Força de Trabalho, o que assegura revisão periódica;
- para romper com as rotinas desestimulantes ou mesmo reter os servidores em suas carreiras, tendo em vista o fato de que 41% dos servidores que responderam o formulário digital declararam estudar para outra carreira, deve haver a previsão de uma sistemática de avaliação de desempenho que repercuta positivamente na ascensão na carreira e que estimule: a capacidade de iniciativa, a adaptabilidade, o trabalho em equipe e a criatividade como fatores relevantes ao desenvolvimento funcional;
- deve-se, portanto, transformar a avaliação periódica de desempenho de um instrumento temido – tendo em vista o caráter punitivo que lhe foi conferido no trato constitucional pela Emenda Constitucional nº 19/98 – a um mecanismo que situe o servidor, dando-lhe senso de orientação e estímulo meritocrático ao trabalho comprometido;
- as avaliações periódicas de desempenho devem ser justas, para não caírem no habitual descrédito, ou seja, devem resguardar (tanto nos critérios previstos, como, principalmente, na sua aplicação prática) o equilíbrio entre rendimentos quantitativos e qualitativos;
- logo, não se admite, no atual estágio de desenvolvimento da sociedade contemporânea, que gestores públicos pensem dentro dos paradigmas industrializantes e tayloristas, fixando metas excessivas sem considerar as possibilidades estruturais e os limites materiais e humanos existentes nas repartições públicas;
- assim, é um desafio do Direito Administrativo considerar, resguardados os valores de impessoalidade e da isonomia, também, no seu repertório de preocupações, a dignidade do servidor público, engendrando soluções jurídicas que o estimulem ao desenvolvimento de habilidades e competências relevantes na ascensão funcional; e
- para tanto, faz-se necessária a revisão da percepção do servidor público enquanto peça substituível de uma engrenagem com vida própria, vinculada por leis herméticas, pois o servidor deve ser estimulado a perceber que, como ser único, é capaz de dar sua mais significativa contribuição para o aperfeiçoamento das atribuições funcionais, sendo o funcionamento das organizações estatais ditado não só em razão de fatores como atribuições legais ou conformações estruturais da Administração Pública, mas pela valorização das pessoas que as integram.
NOTAS:
1 Disponível em: http://participacao.mj.gov.br/pensandoodireito/wp-content/uploads/2013/04/Obra-ANAIS-UNINOVE.pdf
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